NAPOLEÃO RODRIGUES LAUREANO




A dor eleva, a dor exalta, a dor diviniza.
- Guerra Junqueiro


Napoleão Rodrigues Laureano nasceu em Natuba, então integrada ao município de Umbuzeiro, a 22 de agosto de 1914 e faleceu no Rio de Janeiro, a 31 de maio de 1951. Era filho do tenente Floriano Rodrigues Laureano e D. Theophila Bezerra da Silva. Foi casado com D. Marcina Sampaio de Melo Laureano, filha de José Oemio de Melo e Maria Sampaio de Melo. Como filha, o casal adotou Maria do Socorro Sampaio Laureano, nascida no Recife a 18.06.1946.

Em 1943, diplomou-se pela Faculdade de Medicina pela Universidade Federal de Pernambuco, em 1943, após um curso brilhante, onde se distinguiu entre seus companheiros de turma; foi discípulo do renomado professor Ageu Magalhães, grande anatomo-patologista pernambucano, tendo freqüentado o Serviço Nacional do Câncer, no Rio de Janeiro. Especializou-se em cirurgia do câncer.

Logo após sua formatura, voltou a João Pessoa e abriu consultório na rua Barão do Triunfo, 474 – 1º andar. Conforme anúncio publicado no jornal A UNIÃO durante o mês de outubro de 1944, Napoleão Laureano oferecia seus serviços nas seguintes especialidades: Doenças das senhoras, operações, partos, tratamento cirúrgico das cicatrizes e outros defeitos congênitos ou adquiridos. A essa época residia à rua Monsenhor Walfredo, 663, em Tambiá.

Ao lado do Dr. Asdrúbal Marsiglia de Oliveira, Laureano foi dos primeiros médicos paraibanos a se dedicarem ao tratamento do câncer, uma doença maldita e preconceituosa nos anos 40. O canceroso, mesmo entre os profissionais da Medicina, era discriminado. Nem todos se acercavam do paciente com uma dose de humanismo.


Participação política


Desde os tempos de universitário, vivendo os momentos finais da ditadura de Getúlio Vargas, Laureano engajara-se no movimento dos estudantes pernambucanos contra o Estado Novo. Era natural seu comportamento nessa fase da vida brasileira, embora não fosse um militante de primeira linha.

Sua dedicação no atendimento dos pobres fê-lo ingressar na política em 1945, por ocasião da redemocratização, filiando-se à União Democrática Nacional – UDN, partido por onde foi eleito vereador para a Câmara Municipal de João Pessoa.

Após tantos anos sem funcionar, a campanha para vereador foi bastante renhida por se tratar da primeira eleição para a Câmara Municipal, com os candidatos se engalfinhando na disputa por apenas doze vagas.

A União Democrática Nacional – UDN fez a maioria dos vereadores, tendo Napoleão Laureano recebido uma votação consagradora, ficando em segundo lugar, com 959 votos, suplantado apenas pelo vereador Cabral Batista, que obteve 974 votos.

Na primeira eleição da Mesa Diretora da Câmara, ele foi eleito Vice-presidente, tendo logo em seguido assumido a Presidência, desde que o Presidente, vereador Miguel Bastos, assumira a Prefeitura, uma vez que seus titulares, prefeito e vice-prefeito entraram de licença para tratamento de saúde. Assim, Laureano foi o primeiro Presidente da Câmara Municipal de João Pessoa nessa nova fase.

Sua liderança era inconteste, pois chegou a ser seu presidente no período de 49/51, tendo se afastado por ter sido acometido de câncer. Com sua morte a 31 de maio de 1951 deixou de assumir a presidência da Câmara, cuja direção era composta por ele, como Presidente; Miguel Bastos Lisboa, Vice-presidente; Henrique Bernardo Cordeiro; 1º Secretário; João Batista Cabral, 2º Secretário. Logo após a sua morte, no dia 5 de junho o vereador Miguel Bastos Lisboa foi eleito para substitui-lo.

Era Governador do Estado José Américo de Almeida.


O martilógio


A doença de Laureano ensejou uma luta sem quartel, promovendo uma grande campanha nacional em prol da assistência hospitalar aos cancerosos do Brasil, contribuindo para a fundação do Hospital do Câncer da Paraíba e a criação da Fundação Nacional do Câncer, no Rio de Janeiro.

Por sua pertinácia na conquista desse desiderato, foi consagrado como o patrono dos cancerosos.

O noticiário do jornal A UNIÃO, a partir de 13 de março de 1951, passou a informar com assiduidade a situação da saúde de Napoleão, assim como os jornais do Rio de Janeiro passaram a se ocupar de sua situação, enfatizando o problema do câncer no país, onde cerca de 30 mil brasileiros eram portadores daquele mal.

Na sexta-feira, 16 de março, Napoleão seguiu para o Rio de Janeiro numa tentativa final para curar-se. Sua ida para o Rio visava submeter-se a um tratamento de soroterapia, tratamento esse baseado nos estudos do cientista russo Bogolomet e do francês Darach e adaptado no Rio de Janeiro pelo conhecido médico Fiedler Hungria.



Antes ele já havia ido aos Estados Unidos, onde permaneceu alguns meses tratando-se no Memorial Center Hospital de Nova York, onde os especialistas o haviam desenganado ante às precárias condições do combate ao câncer da época, dando-lhe semanas ou meses de vida.

Em Recife, onde se encontrava, após retornar dos Estados Unidos, foi sempre cercado dos cuidados da classe médica e da população, que vinham acompanhando seu estado de saúde, o qual era cada dia mais grave, uma vez que perdia forças a olhos vistos.

Foi aberta uma subscrição pública para custear sua viagem ao Rio. Mas as despesas previstas eram enormes. Daí Napoleão ter feito um apelo aos paraibanos, através dos DIÁRIOS ASSOCIADOS: “Ajude-me a morrer tranqüilo”.



O idealista

Ele aproveitou sua breve existência para traçar um vasto plano de ação em benefício dos cancerosos brasileiros. Dirigiu-se, primeiramente, ao governador José Américo de Almeida, pedindo uma verba para adquirir um equipamento de radium destinado ao serviço de verificação de óbitos e de anatomia patológica para João Pessoa e para a preparação de um técnico competente para utilizá-lo. Essa verba solicitada seria de 150 mil cruzeiros.

Em sua mensagem, afirmou:



...não tenho intuitos sensacionalistas e não desejo me transformar em herói ou mártir da ciência, quero, isto sim, contribuir para aplacar as dores dos que, como eu, foram atacados da terrível moléstia. Não me preocupa a proximidade da minha morte”.

Dr. Asdrúbal de Oliveira, médico de renome e professor universitário laureado, certa vez, em entrevista declarou:



Posso dizer com certeza algo desse colega, Napoleão Laureano, em virtude de eu ter privado com ele, na época mais difícil em que a Paraíba se preparava para tratar do câncer. Ele era um idealista. Para a vida que levou, o resultado econômico não era problema para ele, jamais deixou de atender um paciente porque não dispunha de recursos. Seu consultório, que eu convivi e freqüentei, atendia 80% dos pacientes, gratuitamente. O seu lado humano, é preciso que se diga, era absolutamente perfeito de bondade, era um homem voltado para o sofrimento humano, sem levar em consideração seus problemas pessoais. O gesto mais nobre e engrandecedor de Napoleão Laureano, após saber que era canceroso, foi procurar o presidente Getúlio Vargas e pedir-lhe que construísse um hospital de câncer na Paraíba. Ele foi o único responsável ideológico pela construção desse Hospital que, por merecimento, tem o seu nome.”



Ele sempre se queixava que a demora em se auto-diagnosticar foi por conta da falta de aparelhagem na Paraíba para tal, razão por que seu primeiro pedido ao governador José Américo de Almeida foi para que adquirisse um equipamento de radium.

O câncer que atingiu Napoleão Laureano estava localizado no maxilar e, em menos de um ano do aparecimento dos primeiros sintomas, dominara-lhe inteiramente o organismo.



O jornalista Yeddo Mendonça, da Agência Meridional, assim o descreveu em despacho telegráfico:



Magro, macilento, de pernas fracas, o corpo inclinado, anda com dificuldade, apesar da muleta e bengala em que se apóia. Quantos o vêem têm a impressão de que sua vida está por um fio, podendo extinguir-se a qualquer momento, isso, contudo, não o impede de atender a dezenas de pessoas que o procuram desde o momento de sua chegada aqui (em Recife). Para a imprensa tem sempre palavras de agradecimento e esperanças. Concluindo, manifestou a esperança de que os DIÁRIOS ASSOCIADOS o auxiliem nessa campanha de benemerência pelo Brasil”.



Antes de viajar para o Rio, Napoleão esteve em João Pessoa, sendo recebido no aeroporto de Santa Rita por autoridades, jornalistas e milhares de pessoas de todas as camadas sociais. Em seguida, grande massa locomoveu-se até a sua residência, à Avenida Capitão José Pessoa, em Jaguaribe, acompanhando o automóvel que o transportava. A Rádio Arapuan transmitiu todo o drama de sua chegada à Paraíba, que vinha dos Estados Unidos, após passar alguns dias no Recife.



Iniciada a campanha pró-Hospital do Câncer



Suas primeiras revelações foram no sentido de lançar a idéia de construir um hospital para cancerosos em João Pessoa, com a contribuição voluntária de quantos quisessem ver concretizada uma obra que, além de marcar um grande passo na história da Paraíba, viria contribuir para a diminuição de óbitos produzidos pela terrível moléstia.

O movimento, a princípio encabeçado pelo jornalista e fotógrafo Rafael Mororó, mereceu o apoio do Governo, de autoridades estaduais e municipais e do povo em geral, passando a ser patrocinado pela Rádio Arapuan, por iniciativa do Dr. Eduardo Bergallo, superintendente daquela Rádio, que possibilitou uma intensa propaganda pela campanha em nosso Estado.

A idéia lançada obteve apoio imediato, com a contribuição de diversas pessoas, tendo inicialmente o prefeito da cidade, Oswaldo Pessoa, contribuído com a metade dos seus vencimentos, durante dois meses.

Na A UNIÃO de 14.03.51 o escritor Lopes de Andrade fez uma crônica intitulada Da Vida e da Morte sobre Napoleão e Juarez Batista, diretor daquele jornal, representando o governador José Américo de Almeida, visitou Laureano para manifestar-lhe o apoio do Governo na construção de um hospital. Juarez Batista, na oportunidade, entrevistou Napoleão Laureano, conforme foi publicado naquela edição.

Foram palavras de Laureano: “Estou entusiasmado. Foi a Paraíba que deu o primeiro grito no sentido de positivar a criação do hospital”. E acrescentou: “O serviço contra o câncer funcionará”.

Durante a entrevista, o cônego José Coutinho, um das figuras destacadas do assistencialismo na Paraíba, após apertar a mão de Laureano, disse: “Dr. Napoleão, trago-lhe as preces de todos os pobres que o Sr. operou gratuitamente”, recebendo como resposta: “A alma está muito forte. Não tenho medo .”

Na ocasião, a reportagem de A UNIÃO registrou a presença de destacadas personalidades do mundo social paraibano, entre elas: Drs. José Betâmio Ferreira, Luiz Ribeiro Coutinho, Newton Lacerda, Pedro Honorato Pereira, Giuseppe Marques, Manoel Paiva, Cícero Leite, Hermes Fonseca, Fernando Carneiro, Fernando Milanez, Janson Guedes, prefeito Oswaldo Pessoa, Newton Borges, Abelardo Jurema, padre João Onofre, além do jornalista José Leal e do fotógrafo José Medeiros, de O CRUZEIRO.

No dia 15 de março, ocorreu a posse da nova mesa diretora da Câmara Municipal. Laureano havia sido eleito presidente para o período 1951/52. Ele foi empossado, embora sem comparecer. A Mesa ficou assim constituída: Presidente: Napoleão Laureano; Vice-presidente: Miguel Bastos Lisboa; 1º Secretário: Henrique Bernardo Cordeiro; 2º Secretário: João Batista Cabral.

Os acadêmicos de Medicina foram os primeiros a se movimentarem em torno da campanha pró-construção do Hospital Napoleão Laureano, em João Pessoa, formando uma comissão constituída dos universitários Gilvandro Pinto Moura, João Cavalcanti de Albuquerque e Jurandir Macedo de Carvalho. Essa comissão comunicou que havia sido instalada uma Comissão Central que dirigiria a propaganda, com a participação do Dr. Newton Lacerda, diretor da Faculdade de Medicina da Paraíba; Dr. Miranda Freire, presidente da Sociedade de Medicina; Dr. José Mousinho, presidente da Associação Comercial e desembargador Severino Montenegro, provedor da Santa Casa da Misericórdia.

Inicialmente, a Cia. Exibidora de Filmes, do grupo Wanderley, promoveu um festival com vários artistas da Rádio Tabajara, no Cinema Rex, com rendimento em benefício da campanha. O Plaza exibiu o filme “Delírio” e o cinema S. Pedro exibiu outro filme, com a mesma finalidade. Os funcionários do Banco do Brasil oferecerem uma razoável contribuição e apelaram para o presidente do Banco do Brasil, Ricardo Jafet, sugerindo que o Banco do Brasil contribuísse com um milhão de cruzeiros para a campanha. Posteriormente, o Banco do Brasil contribuiu com Cr$ 500 mil. A Secretaria de Agricultura do Estado oficiou a várias repartições sugerindo o engajamento na campanha. Sob a presidência do Dr. José Rafael de Menezes, reuniram-se os diretores de grupos escolares e inspetores técnicos da capital e aclamaram uma Diretoria para promover a campanha em sua área. A Comissão ficou assim constituída: Presidente – Dr. José Rafael de Menezes, Diretor do Departamento de Educação; Secretária – Professora Maria da Conceição de Freitas, inspetora técnica da 1a zona; Tesoureira – Adelita Bezerra Cavalcanti, diretora do Grupo Thomaz Mindelo; Orientador do movimento – professor Rubens Filgueiras, Inspetor Geral do Ensino. De logo, entre várias providências, ficou estabelecida uma contribuição mínima de CR 10,00 para os professores do interior, sendo designada a Diretora do Grupo Escolar de cada cidade como chefe do movimento em cada comunidade.



Viagem ao Rio de Janeiro, última esperança



No dia 16 de março, Napoleão Laureano chegou ao Rio, mantendo contato imediato com o cientista húngaro Josef Fiedler a fim de se submeter a uma soroterapia especial. O Presidente Vargas havia oferecido um avião da FAB para transportar o Dr. Napoleão Laureano ao Rio, tendo Laureano agradecido a gentileza do Presidente, por ser mais cômoda a viagem pelo Constelation da PANAIR. Como a aeronave da PANAIR atrasou, Napoleão viajou pelo avião da FAB que lhe fora oferecido pelo presidente Vargas.

Sua situação havia piorado, pois a outra perna tinha sido atingida, criando-lhe dificuldade para andar.

O Presidente Getúlio Vargas ofereceu a Laureano um importante posto no Serviço Nacional do Câncer em reconhecimento do Governo e da Nação pelos seus esforços humanitários. Convidou também a esposa de Laureano, D. Marcina, para o posto de enfermeira-chefe daquele Serviço.

O DIÁRIO CARIOCA anunciou que no dia seguinte, na sede do jornal, haveria uma mesa redonda com a participação de Laureano, presentes Drs. Mario Kroeff, Alberto Coutinho, Jorge Marsillac, Orlando Machado e outros especialistas do câncer, tendo sido convidados também o Ministro da Educação, o Prefeito, o Diretor da Saúde, o Secretário da Saúde e Assistente da Prefeitura. O assunto principal era o problema do câncer no país, havendo uma verdadeira sabatina, transmitida por várias emissoras cariocas com perguntas e respostas.

Nenhuma esperança de cura foi dada a Napoleão Laureano, esclarecendo os especialistas que o linsofarcoma que o atacou só teria possibilidade de cura se tratado imediatamente após a descoberta e localização do câncer.

Dr. Mario Kroeff, após examinar Laureano, recomendou seu tratamento no Serviço Nacional do Câncer, sob os cuidados dos médicos Orlando Machado e Antônio Vieira, tendo o paciente se internado no Hospital Graffee Guinle, no Flamengo. O tratamento a que foi submetido constou de irradiações para debelar as diferentes localizações que o câncer atingira. Sem qualquer esperança de cura, o objetivo era prolongar sua vida e amenizar os seus sofrimentos.



Movimento nacional de combate ao câncer



Na reunião promovida pelo DIÁRIO CARIOCA o ponto alto foi a criação da Fundação Nacional do Câncer. Na primeira reunião dos fundadores dessa nova instituição foi eleita a seguinte Diretoria: Presidente de Honra – Sra. Darcy Vargas, esposa do Presidente da República, e Vice-presidente de Honra – Assis Chateaubriand, dono dos DIÁRIOS ASSOCIADOS. Presidente efetivo – Dr. Pompeu de Souza, jornalista; Vice-presidente – Dr. Amadeu Fialho, anatomo-patologista; Tesoureiro – Senador Ruy Carneiro; Secretário – Jorge Marsillac, presidente da Associação Brasileira de Cancerologia; Diretor executivo – Dr. Mário Kroeff. Posteriormente, a esposa de Laureano – Marcina Sampaio de Melo Laureano – foi considerada Vice-presidente perpétua da Fundação.

A Fundação Nacional do Câncer, para onde deveriam ser encaminhadas as doações do país, adotou como endereço a rua Erasmo Braga, 22, no Rio de Janeiro, para onde, do país inteiro, começaram a chegar doações de particulares e empresas. O Tesoureiro da Fundação, senador Ruy Carneiro, recebeu de Carlos Rizzini, diretor dos DIÁRIOS ASSOCIADOS, a doação de Cr$ 282.233,00, como contribuição para assistência aos cancerosos do país.

Em João Pessoa, no dia 19, a Comissão Central pró-Construção do Hospital Napoleão Laureano, recentemente criada, reuniu-se no auditório da Rádio Arapuan. Falaram vários oradores: o jornalista e fotógrafo Rafael Mororó, um dos iniciadores da campanha; acadêmico de medicina João Cavalcanti, da comissão de estudantes que levantou a bandeira da criação da Comissão; Dr. Newton Lacerda, que doou logo mil cruzeiros; Oscar de Castro, que falou sobre seu ex-aluno Napoleão Laureano, sugerindo a eleição de um Comitê Central para dirigir a campanha. Imediatamente, sob a direção de Oscar de Castro, foi indicado, por aclamação, o seguinte Comitê Central: Presidente – Desembargador Severino Montenegro; 1º Vice-presidente – Dr. Júlio Rique Filho; 2º Vice-presidente – Dr.Oscar de Oliveira Castro; Secretário Geral – Dr. Hélio Fonseca; 2º Secretário – Rafael Mororó; 3º Secretário – Dr. Eduardo Bergallo; Tesoureiro – Dr. Júlio Maurício. Bergallo, dirigente da Arapuan, colocou as emissoras do seu grupo (Arapuan, Caturité e Espinharas) à disposição da campanha.

A Câmara Municipal de João Pessoa, em sessão do dia 20, aprovou o projeto do vereador Mário Antônio da Gama e Melo abrindo um crédito de cem mil cruzeiros para a aquisição de um terreno onde seria construído o Hospital Napoleão Laureano.

No Senado, o Sr. Ruy Carneiro louvou o apoio do governo paraibano e da população em prol da campanha pela fundação de um Hospital do Câncer na Paraíba.

No Rio de Janeiro, apesar de sua fraqueza, Napoleão Laureano continuava sua campanha em favor dos cancerosos do país, querendo aproveitar suas pequenas melhoras para visitar São Paulo e Minas, onde deflagraria a campanha meritória em prol da criação de órgãos de combate ao câncer e assistência aos cancerosos. No dia 20 falou na Hora do Brasil. Seu entusiasmo não arrefecia, apesar das pioras. Resolveu-se tratá-lo por um método alemão. Crises dolorosas em sua perna levaram os médicos a fazer uma segunda transfusão de sangue em Laureano e uma aplicação de soroterapia.

No dia 28 de março, o deputado federal Janduhy Carneiro fez uma visita a Napoleão, em nome do governador José Américo de Almeida, informando-lhe que o Estado patrocinaria uma viagem a Europa para tratar-se, se isso fosse necessário.

O jornal A UNIÃO transcreve, na 1a página, o seguinte telegrama:



Rio, 28 – Estamos chegando ao fim da marcha – disse o médico Napoleão Laureano a sua esposa, num dos momentos de completa lucidez que teve, em meio às dores já incontroláveis que vem castigando o seu corpo. A tarde e a noite de hoje foram verdadeiramente dolorosas para o Dr. Napoleão Laureano.

A despeito do tratamento, caminha rapidamente para a morte o homem que levantou a maior cruzada na história pela redenção dos cancerosos do Brasil.

Em seu favor nada pode fazer a medicina brasileira, a não ser testemunhar o cumprimento da sentença dos cirurgiões do Memorial Center Hospital, de Nova York. Em conseqüência dos esforços despendidos, desde que aqui chegou, o Dr. Laureano não tem mais forças.Ontem passou a noite em claro, chamando a cada minuto pela esposa, que não o abandonava. Amanheceu melhor e voltou a ser o homem estóico.

Declarou: O povo compreendeu o alcance do movimento que encabecei. Agradeço mais uma vez a colaboração de todos, em meu nome e de todos os cancerosos do Brasil.”



Intensifica-se a Campanha na Paraíba



Enquanto isso, a campanha na Paraíba tomava vulto. O Sindicato dos Rodoviários cedeu sua sede, no Parque Solon de Lucena, para as reuniões do Comitê Central pró-construção do Hospital do Câncer Napoleão Laureano. O Comitê publicava, constantemente, a relação dos contribuintes para a campanha. O Esporte Clube Vasco da Gama foi o primeiro clube a contribuir. O Red Cross tomou a iniciativa de promover um torneio de clubes amadores. O torneio início foi programado para o começo de abril, com a participação dos seguintes clubes: Felipéia, Bando Azul, Continental, Comercial, Íris, Saturno e Red Cross, com renda destinada à campanha. Cada entidade, cada repartição criava uma Comissão para arrecadar as contribuições voluntárias.

Novas tentativas para curar ou aliviar a situação de Napoleão Laureano foram encetadas. O Presidente Vargas intercede para conseguir o envio do soro Krebiozen, dos Estados Unidos. A embaixada brasileira em Washington diligenciou para a vinda do soro Krebiozen de Chicago para o Brasil, que viria por um avião da Braniff, tendo como portador o próprio comandante da aeronave. Já no dia 4 de abril, os médicos de Napoleão registraram melhoras após a aplicação da primeira ampola do Krebiozen.

Eram tocantes os apelos de Napoleão para angariar donativos em favor da causa. Talvez por isso Napoleão fora eleito membro de honra do Instituto Brasileiro de História da Medicina, numa homenagem ao movimento por ele iniciado.

A campanha local continuava de vento em popa, com o apoio de várias entidades. O Distrito 123 do Rotary International, que englobava os Estados da Bahia ao Ceará, reunido em Salvador em sua Conferência Distrital, recomendou o apoio de todos os clubes da região; a Associação dos Servidores Públicos do Estado – ASPEP iniciou campanha entre seus associados; o Clube Internacional, de Cruz das Armas, promoveu festa para arrecadação de contribuições; o Diretório Acadêmico de Medicina do Recife iniciou campanha; no Ponto de Cem Réis foi criado um Posto de Arrecadação do Comitê Central. A Paraíba, que enfrentava problemas com a seca, não descurava da campanha que sentimentalizou a comunidade. As doações se sucediam, de empresas e de pessoas simples.



No dia 27 de março de 1951, o deputado Janduhy Carneiro apresentou na Câmara dos Deputados o projeto nº 18, que autorizava o Poder Executivo a abrir ao Ministério da Saúde o crédito especial de cem milhões de cruzeiros.

Essa iniciativa do operoso parlamentar paraibano resultou na conclusão do Instituto Nacional do Câncer, na Praça da Cruz Vermelha, no Rio de Janeiro, devidamente equipado.

Mas a situação de Napoleão Laureano se agravava, com a fratura do colum. Foi necessário fazer o engessamento dos membros inferiores e da bacia. Nova aplicação de Krebiozen foi feita. O embaixador americano no Brasil acompanhava o desenvolvimento do tratamento. Mas Napoleão teimava em vir para a Paraíba para apoiar a campanha pela fundação do Hospital.



Desentendimentos



O DIÁRIO DA NOITE, do Rio de Janeiro, afirmou que “o caso do Dr. Napoleão Laureano está assumindo aspecto de um caso político, com repercussão nos Estados e mesmo no Exterior.

O professor Durovic, descobridor do Krebiozen, já se confessou francamente desgostoso por não terem os médicos assistentes do Dr. Napoleão Laureano, tendo à frente o diretor do Serviço Nacional do Câncer, seguido rigidamente as suas instruções, principalmente quanto à suspensão de aplicação de raios X, enquanto durante o emprego do Krebiozen.”

E continua o DIÁRIO DA NOITE: “O professor Durovic mostra-se sentido, segundo informa o Itamarati, pelo fato de seus insistentes pedidos sobre a situação do doente, não terem sido respondidos, a não ser por iniciativa da Agência Meridional, e pelo Dr. Napoleão, depois de decorrido longo tempo.

Outro aspecto da questão da aplicação do Krebiozen, que está causando surpresa geral, é o fato da monografia feita pelo médico Andrew Ivy, a pedido do Vice-cônsul do Brasil sobre o medicamento, somente ter sido traduzido parcialmente, permanecendo até o presente desconhecida, inclusive pelo próprio Dr. Napoleão Laureano.

Anuncia-se mesmo que a monografia está perdida. Esses são os pontos principais em torno dos quais está sendo criado um caso político ao doloroso, mas heróico episódio do Dr. Napoleão Laureano, que está dando a vida em benefício de todos os cancerosos do Brasil”.

O repórter da Agência Meridional, Yeddo Mendonça, acompanha de perto as inconveniências citadas pelos jornais, tendo Napoleão o autorizado a revelar os acontecimentos, “podendo revelar tudo o que sabe sobre o assunto”.

Tudo isso por conta de uma declaração distribuída pela Fundação Nacional do Câncer, em 27 de abril. A cunhada de Napoleão, D. Márcia, informou que Napoleão assinara uma declaração para ser publicada pela Fundação, mas esta foi alterada sem seu consentimento, o que não agradou a Napoleão, que se considerou enganado e traído pelo presidente da Fundação, Dr. Mário Kroeff. Ao tomar conhecimento do teor da nota publicada, Napoleão experimentou violenta crise e chorou, gritando em plenos pulmões que desejava voltar à Paraíba.



O repórter comenta:



Seu estado é grave. Este é um caso de abuso de boa fé de um homem que está doente, sem forças, condenado à morte”.



E continua:



Devemos dizer que sobre a questão não ouvimos o próprio Dr. Napoleão Laureano em sinal de respeito pela sua saúde, agravada consideravelmente. Todavia, ele nos autorizou, por intermédio de sua cunhada Márcia, a escrever estas palavras. Por outro lado, o documento que temos nos levam a afirmar que a política do câncer está matando o Dr. Napoleão.”



Napoleão teve um colapso e está sob a ação de injeções, informou o repórter.

Diante do agravamento da situação, o senador Ruy Carneiro fez uma visita a Napoleão Laureano, oportunidade em que lhe dá conta da ação da Fundação Nacional do Câncer, da qual é o tesoureiro. A UNIÃO publica foto da visita, onde o senador Ruy Carneiro aparece em conversa com o Dr. Laureano e sua esposa Marcina.

A terceira dose do KREBIOZEN é administrada.

Em 10 de maio, o Dr. Durovic telegrafa a Napoleão: “Recebemos os boletins até 7 de maio. O último é escasso e incompleto. Mandem em futuro informações extensas sobre o mediastro e o número de leucócitos são muito importantes”.

Foram enviadas as informações solicitadas, aguardando-se nova comunicação do Dr. Durovic, para a aplicação da 4a dose do KREBIOZEN.

No dia 15 de maio, o jornalista Pompeu de Souza, presidente da Fundação Nacional do Câncer, chegou a iniciar entendimentos junto às autoridades federais e sociedades médicas para a vinda do Dr. Stefan Durovic, médico iugoslavo descobridor do KREBIOZEN. O Dr. Durovic aceitou, em princípio, visitar o Brasil, tendo feito uma comunicação nesse sentido ao Dr. Napoleão Laureano.

A procura do terreno para construir o Hospital



Enquanto isso, por solicitação do jornalista Pompeu de Souza ao governador José Américo, foi iniciada a procura pelo terreno onde seria construído o Hospital da Paraíba, cabendo ao Dr. Newton Lacerda localizá-lo. As contribuições continuavam chegando. Eram entregues aos membros do Comitê durante suas constantes visitas a repartições municipais, estaduais e federais. A Caixa Econômica, presidida pelo Dr. Manoel Morais, doou cinco mil cruzeiros e prometeu 20 mil cruzeiros para a aquisição de uma tenda de oxigênio. Os escritores Antônio Botto de Menezes, Hermilo Borba e Cristino Pimentel doaram os livros de sua autoria Minha Terra, Cantos da Ausência e Dois Poetas, para serem vendidos em favor da campanha. Todos colaboravam como podiam.

Mais uma vez o escritor Lopes de Andrade publica um artigo intitulado O Mártir Napoleão Laureano.

No dia 30 de maio viajaram para João Pessoa os Srs. Jorge Marsillac e Jorge Ferreira, designados pelo Ministro da Educação para escolherem o terreno onde deveria ser edificado o Hospital Dr. Napoleão Laureano.



O desenlace final



Às 20,20 horas do dia 31 de maio, Dr. Napoleão Laureano faleceu no Hospital Graffee Guinle, no Rio de Janeiro.

Diz o sucinto noticiário telegráfico enviado para o jornal A UNIÃO:



RIO, 31 (Urgente) (Meridional) – Faleceu às 20 horas e 20 minutos de hoje, o Dr. Napoleão Laureano, após receber os últimos sacramentos ministrados pelo padre Luiz Siqueira Campos, vigário de Barra Funda, do Estado de São Paulo.



A última dose de KREBIOZEN havia chegado as 8,30, não sendo aplicada. D. Marcina doou o KREBIOZEN ao padre Luiz Siqueira Campos, que também era canceroso e viera de Barra Funda exclusivamente para conhecer Napoleão, terminando por dar-lhe a extrema unção.

O senador Ruy Carneiro, que assistiu aos últimos momentos de Napoleão, dirigiu o seguinte telegrama ao governador José Américo de Almeida:



RIO, 31 – Com pesar, comunico ao eminente amigo que acabo de assistir aos últimos momentos do Dr. Napoleão Laureano, no Hospital Graffee Guinle. O corpo está sendo embalsamado, devendo ser transportado a essa Capital amanhã, sábado, por avião da FAB. Abraços. Ruy Carneiro.



No dia 1º, o governador José Américo de Almeida recebeu o seguinte telegrama do ministro Simões Filho, da Educação:



Cumpro o doloroso dever de comunicar a V. Excia. que o Governo da República, associado-se à comoção que suscitaram no País os sofrimentos estóicos e morte do Dr. Napoleão Laureano, deliberou fazer os seus funerais e trasladação dos seus despojos para o seu Estado natal. Apresento ao Povo paraibano, por intermédio de V. Excia., as condolências do Governo, das quais participo, com viva emoção. SIMÕES FILHO, Ministro da Educação.



O Governo do Estado decretou luto por três dias. A cidade parou. O Clube Astréia cancelou sua tradicional festa de aniversário.

Terminara o martírio do indomável Napoleão e o sofrimento transferiu-se para a população que acompanhava, há três meses, o lancinante episódio de uma saga martirológica no combate à insidiosa moléstia.

A Paraíba, como o Brasil inteiro, assistiu ansiosa ao desenrolar daquele drama de heroísmo e resignação, de devotamento à causa da ciência e ao bem do próximo, que foram os derradeiros dias do médico canceroso, que conseguiu levantar todos os brasileiros numa cruzada inédita, contra o mal que o vitimou.



A Paraíba enlutada



O corpo de Napoleão Laureano foi embalsamado e ficou em câmara ardente exposto na Igreja da Candelária, onde foi visitado por milhares de pessoas.

No dia seguinte, o corpo foi trazido para João Pessoa, em avião da FAB, pousando no Aeroporto de Santa Rita, onde estiveram presentes o governador José Américo de Almeida, Secretários, representantes do Legislativo e do Judiciário, autoridades militares: Comandante da Guarnição Federal e Capitão dos Portos, autoridades eclesiásticas e povo. Não obstante as chuvas caídas na tarde do sábado, o número de pessoas no aeroporto era bastante grande.

O esquife foi retirado pelo Governador, pelo presidente executivo da Fundação Laureano, prefeito da Capital, presidente da Assembléia Legislativa, presidente do Tribunal de Justiça, presidente da Câmara Municipal e familiares. Colocado no carro funerário, o cortejo seguiu para João Pessoa e ao chegar no centro urbano parou diante da Câmara Municipal, órgão da qual Laureano fizera parte como vereador e seu presidente recém-eleito. Na ocasião, falou de improviso o vereador Ranulpho de Oliveira Lima, ressaltando as qualidades morais de Napoleão Laureano e a sua atuação naquele Conselho Municipal.

A seguir, o corpo foi levado para a Catedral Metropolitana, onde ficou em câmara ardente até às 15,30 horas do dia seguinte. O comércio fechou suas portas, em atendimento ao apelo feito pela Câmara Municipal.

Durante dia e noite, o corpo foi guardado por representantes da Câmara Municipal, do Governo do Estado, da Assembléia Legislativa, do Poder Judiciário, da Fundação Napoleão Laureano, da Sociedade de Medicina, de autoridades militares, do comércio e da indústria, dos estudantes e universitários, do Sindicato dos Rodoviários e da Associação dos Servidores Públicos, que se revesavam de hora em hora.

As exéquias de Napoleão Laureano foram oficiadas pelo Arcebispo Metropolitano, D. Moisés Coelho.

Milhares de pessoas acompanharam o féretro até o Cemitério da “Boa Sentença”, sendo um dos mais concorridos enterros já vistos em João Pessoa, enchendo cerca de três quilômetros das ruas limítrofes do Campo Santo.

Durante o sepultamento, falaram Dr. Luiz Rodrigues de Souza, Secretário da Educação e Saúde, em nome do Governo do Estado; deputado Ivan Bichara Sobreira, pela Assembléia Legislativa; Dr. Higino da Costa Brito, pela Sociedade de Medicina; Dr. Newton Lacerda, pela Faculdade de Medicina da Paraíba; e o escritor Juarez Batista, diretor de A UNIÃO, pela Fundação Napoleão Laureano. Falaram ainda o vereador Damásio Franca e o Dr. Hélio Fonseca.



Na Câmara Federal, o deputado Janduhy Carneiro fez o necrológio do médico Napoleão Laureano, enaltecendo as suas virtudes morais e espirituais, para dizer que o Dr. Napoleão Laureano desapareceu inscrevendo o seu nome ante a empolgante página da história da medicina nacional e contemporânea.

Após longos comentários a respeito do heróico gesto de abnegação e estoicismo do ilustre morto, cujo exercício profissional em João Pessoa foi um verdadeiro apostolado, pela desambição e espírito de reverência, o orador agradeceu em nome do Governo e do povo paraibano a comovedora assistência moral e material que lhe deram o Presidente da República, Ministro da Educação, diretor do Serviço Nacional do Câncer e seus assistentes médicos, toda a imprensa carioca e a vigilância carinhosa e o interesse tomado pelo povo brasileiro e do Rio de Janeiro, durante o verdadeiro ingente sofrimento do Dr. Napoleão Laureano.

A Câmara dos Deputados, no dia 10 de junho, aprovou projeto considerando a Fundação Nacional do Câncer como sendo de Utilidade Pública.

O padre Francisco Lima, sócio do Instituto Histórico e Geográfico Paraibano, fez mais um artigo sobre Napoleão Laureano.

O Governador do Estado recebeu mensagens de condolências da Paraíba e de várias instituições e pessoas de diversos pontos do país: de D. Darcy Sarmanho Vargas, em nome da LBA, e autorizando a sra. Alice de Almeida representá-la nos funerais; do Bispo de Natal; Monsenhor Lindolfo Ubhi, de Barras; Hermilo Miliis, União, SC; Zé da Luz, do Rio; Loja Maçônica “Regeneração Campinense”, de Campina Grande; José Braga, do Rio; Pedro de Souza, Rio; Apolônio Sales de Miranda, do Rio; Academia Paraense de Letras, de Belém, PA; deputado federal Paulo Abreu, de S. Paulo; Assembléia Legislativa do Maranhão, de São Luís; Simão Patrício da Costa, Rio; Sociedade de Estudos Sociais e Políticos, Rio; Câmara Municipal de Salvador, BA; Câmara Municipal de Maceió, AL; Câmara Municipal de Belém, PA; Câmara Municipal de Belo Jardim, PE; Câmara Municipal do Rio, RJ; Câmara de Vereadores de Itabuna, BA; Câmara de Vereadores de Goiana, PE; Círculo Operário de Sousa, PB; União dos Retalhistas, de João Pessoa, PB; Câmara Municipal de Mamanguape, PB; Câmara Municipal de Bananeiras, PB; Câmara Municipal de Jaboatão, PE; Câmara Municipal de Parnaíba, PI; Câmara Municipal de Duartina, SP; Câmara Municipal de Umbuzeiro, PB; Câmara de Vereadores de Feira de Santana, BA. Várias sociedades publicavam notas de pesar pelo falecimento de Laureano: Clube Astréia, Associação dos Servidores Públicos do Estado, Rotary Club de João Pessoa, Sindicato dos Rodoviários, dos Bancários, etc.

Como era de se esperar, após tantos sofrimentos no acompanhamento da doença de Laureano, sua esposa, D. Marcina, passou alguns dias no Recife, recuperando-se das canseiras de sua luta. Seu estado de saúde era delicado, chegando-se a aventarem a hipótese de que ela também estivesse com câncer. A família negou essa hipótese. Apenas informou que ele sofrera uma intervenção cirúrgica e estava em convalescença.

O desembargador Severino Montenegro e o professor José Baptista de Melo, presidente e secretário da Fundação do Hospital Laureano, visitaram D. Marcina Laureano em sua residência à rua Capitão José Pessoa, tão logo ela retornou do Recife. Na ocasião D. Marcina entregou ao desembargador Montenegro a quantia de Cr$ 16.500,00 que lhe haviam ofertado no Rio de Janeiro para a campanha do Hospital na Paraíba.



Testamento



Com o objetivo de divulgação, D. Marcina entregou um documento assinado por Napoleão Laureano em 3 de abril de 1951, no qual resume suas disposições na orientação da campanha contra o câncer em todo o Brasil e por ele redigida em colaboração com o Dr. Mário Kroeff. Era uma espécie de testamento com suas últimas vontades, tanto quanto possível na aplicação dos fundos angariados em todos os pontos do território nacional.

O texto do documento é o seguinte:



a) Se o patrimônio apurado atingir apenas três milhões de cruzeiros ou menos, será destinado à criação de um centro de diagnóstico e tratamento do câncer, anexo ao Hospital São Cristóvão, na cidade de João Pessoa, na Paraíba;



b) Se o patrimônio atingir a soma de cinco milhões de cruzeiros será empregado na construção de um hospital de 50 leitos, mais ou menos, independente e especializado no diagnóstico e tratamento do câncer. Nesse caso a manutenção ficará a cargo dos Governos Estadual e Federal e de algum auxílio de que possa dispor a Fundação Laureano. A Fundação Laureano envidará esforços junto ao Serviço Nacional do Câncer no sentido de ser facultado um auxílio anual sob a forma de convênio, como vem estabelecendo com outras entidades nos Estados da União;



c) Se o patrimônio exceder de cinco milhões, o restante, até 15 milhões, deverá constituir um fundo de reserva, cuja renda será empregada em auxílio e melhora da manutenção do pessoal e do material técnico do hospital;



d) Se o patrimônio for superior a 15 milhões e inferior a 20 milhões, o excedente será empregado na melhora das instalações técnicas do referido hospital;



e) Se o patrimônio for superior a 20 milhões, o excedente será empregado na aplicação de medidas relativas ao problema do câncer no país. Aí poder-se-á atender à questão da pesquisa em laboratórios apropriados, a critério da Fundação Laureano, e à distribuição de bolsas de estudos no país ou no estrangeiro, aos cursos de formação de técnicos em cancerologia, e contratos de especialistas estrangeiros para trabalhar no Brasil, onde for mais conveniente, campanha de educação popular no país e outras questões atinentes ao problema do câncer.

Rio de Janeiro, 3 de abril de 1951.

a) Napoleão Rodrigues Laureano

  1. Mário Kroeff

Testemunha: Antônio Gonçalves de Medeiros.” 1



D. Marcina Laureano informou aos visitantes que havia recebido convite do jornalista Pompeu de Souza, presidente executivo da Fundação Nacional do Câncer, para participar da solenidade religiosa do 30º dia da morte de Laureano que seria realizada no Rio de Janeiro, razão por que tão logo se recuperasse da convalescença da intervenção cirúrgica a que foi submetida seguiria para a Capital Federal.

No Rio, assegurou D. Marcina, trataria junto às autoridades do Serviço Nacional do Câncer dos interesses da Fundação na Paraíba.



A campanha continua



Passada essa fase aguda post-mortem, foi reiniciada a campanha para angariar donativos.

Em 24 de junho, o Comitê Central da Campanha na Paraíba, como fazia semanalmente, publicou um comunicado informando que até aquela data havia sido arrecadada a quantia de Cr$ 236.451,00.

A Câmara Municipal de João Pessoa encarregou-se de homenagear o Dr. Napoleão Laureano por ocasião do trigésimo dia do seu falecimento, programando uma missa na Catedral Metropolitana, às 7 horas, e uma homenagem especial às 20 horas na Câmara de Vereadores, com aposição do retrato do seu ilustre ex-presidente.

O Rotary Club de João Pessoa, sob a presidência do advogado Severino Alves Ayres, também prestou homenagem especial no trigésimo dia da morte de Napoleão Laureano, tendo falado o desembargador Severino Montenegro, presidente do Comitê Central da Campanha pela fundação do Hospital do Câncer da Paraíba.

Dia 4 de julho chegaram a João Pessoa, viajando em avião especial, o Dr. Mário Kroeff, diretor do Serviço Nacional do Câncer, Dr. Alberto Coutinho, Chefe da Clínica do SNC e Dr. Amaro Campos, também diretor do SNC. Eles vieram para entenderem-se com o governador José Américo de Almeida sobre assuntos ligados à instalação, no Estado, de um Departamento do Serviço Nacional do Câncer. Os visitantes foram recebidos no aeroporto pelo Governador e autoridades e considerados hóspedes do Estado, tendo o governador e sua esposa, D. Alice Almeida, lhes oferecido um almoço no Palácio da Redenção.



Localizado o terreno para o Hospital Laureano



A ilustre comitiva, em companhia do Governador e autoridades do setor de saúde pública, esteve em diversos locais da cidade escolhendo o ponto para a localização do futuro Hospital do Câncer da Paraíba, o qual foi fixado em terrenos marginais da Avenida João Machado, nas proximidades da Colônia Juliano Moreira.

Entrevistado pela A UNIÃO, Dr. Mário Kroeff deu as seguintes declarações:



Pretende-se construir um hospital suficientemente aparelhado para o diagnóstico e tratamento do câncer. Isso de acordo com o desejo expresso de Napoleão Laureano, que sacrificou os últimos dias de sua existência atendendo ao objetivo de dar aos seus concidadãos os meios necessários ao tratamento do câncer, para que seus patrícios não se encontrem nas mesmas condições em que ele se viu com a falta dos meios de confirmar consigo mesmo, a suspeita de estar sendo minado pela doença atroz e sem microscópio para confirmar ou afastar essa suspeita.

Pode-se dizer que ele perdeu a oportunidade de cura pela falta de meios necessários ao diagnóstico.”



A respeito da construção do hospital para cancerosos em João Pessoa, assim se expressou o Dr. Mário Kroeff na entrevista que concedeu a A UNIÃO:



O hospital que se projeta levantar em João Pessoa, com a capacidade para cinqüenta leitos entre indigentes e contribuintes, é orçado em seis milhões de cruzeiros. Será equipado dos elementos mais modernos do que existe no tratamento correto do câncer.

Pretende-se organizá-lo no sentido de ser um elemento representativo da moderno cancerologia, plantada no nordeste brasileiro. Além de grande alcance médico-social que representará a instituição, será também um monumento memorável ao altruísmo do médico brasileiro que morreu em favor dos que sofrem.”



Perguntado ao ilustre visitante sobre o apoio à campanha pelo Governo do Estado, o Dr. Mário Kroeff adiantou:



Encontramos da parte do Dr. José Américo a melhor boa vontade no sentido de dar toda a cooperação do Estado à obra que nasceu do sacrifício extremo de um filho da Paraíba – Napoleão Laureano. Suas palavras após a nossa chegada foram bem expressivas :”Darei o terreno que os senhores escolherem. Não importa o sacrifício que isso representa, porque a obra que se pretende realizar é de grande significação médico-social”.



De fato – prosseguiu o entrevistado -, o terreno escolhido ficou logo prometido, dentro de todas as exigências, sem calcular-se a extensão do mesmo, nem o valor que representasse a área destinada. Foi mais longe o Governador. Resolveu até tomar toda a providência no sentido de abrir-se nova rua para acesso duplo ao Hospital, de acordo com as facilidades técnicas que isso representa num plano arquitetônico.



Ali mesmo nasceu até o nome da nova rua, que se chamará Napoleão Laureano, mais uma homenagem bem merecida ao homem tão cheio de abnegação e estoicismo.”



Nessa entrevista concedida A UNIÃO, fruto do faro jornalista do seu diretor, escritor Juarez Batista, ficou sintetizada a parte objetiva da campanha em prol do Hospital do Câncer da Paraíba, assim como se fixou um relato sobre a importância da atitude corajosa do nosso conterrâneo ao iniciar o movimento em favor dos cancerosos.



Disse mais o Dr. Kroeff:



Já estamos com o plano do hospital pretendido elaborado por três arquitetos, que a isso se ofereceram gratuitamente, como homenagem prestada à memória do médico mártir, engenheiros Francisco Vitor Palma, Alexandre Costa Neto e Gilberto Leslie, que foram também os arquitetos que elaboraram os planos do Hospital da Sociedade Brasileira de Assistência aos Cancerosos. Pretendemos dar início à construção logo sejam terminados esses estudos preliminares e sobretudo as especificações que devem servir de base à concorrência pública que se pretende abrir imediatamente, tanto em João Pessoa, como no Recife e Rio de Janeiro.”



Prosseguindo, adiantou o Dr. Kroeff, sobre a Fundação Napoleão Laureano:



A fundação nasceu do apelo feito por Laureano à contribuição pública no sentido de serem concretizados seus ideais de filantropia. O reflexo foi de grande profundidade, tendo havido contribuições de todos os recantos do país, desde os grandes aos menores, que trouxeram seus auxílios, às vezes representados por cinco e dez cruzeiros. O total já atingiu seis milhões de cruzeiros, quantia depositada no Banco Hipotecário Lar Brasileiro, fora outras quantias arrecadadas e ainda não entregues à nossa tesouraria, e que se acham, por exemplo, em Santos, cujo vulto atingiu a 300 mil cruzeiros; Correios e Telégrafos, que vai a 100 mil cruzeiros; L. B. A. recebeu diretamente 80 mil cruzeiros; a Rádio Nacional, que ainda tem mais de 300 mil cruzeiros; e finalmente João Pessoa, que, segundo me informou o desembargador Montenegro, as contribuições já ascendem a 300 mil cruzeiros. Essa contribuição da Paraíba de fato representa uma grande demonstração de solidariedade do povo paraibano ao apelo do seu coestadano. Se atendermos as condições financeira de um pequeno Estado em confronto com outros mais ricos e populosos do sul do país, a Paraíba soube honrar o sacrifício do grande mártir Laureano”.



O entusiasmo do Dr. Mário Kroeff, diretor do Serviço Nacional do Câncer, era contagiante no relacionamento com as autoridades estaduais, tornando confiável que a obra seria realmente realizada.

Três dias após a entrevista, o Dr. Mário Kroeff publicou na A UNIÃO um longo artigo sobre a campanha e as providências, manifestando sua confiança que “a luta será vitoriosa em benefício de toda a humanidade”.

No dia 10 de julho, a Câmara Municipal aprovou um projeto concedendo uma pensão de mil cruzeiros a D. Marcina Sampaio Laureano e sua filha Maria do Socorro.

Dona Marcina, que ainda estava traumatizada com os últimos acontecimentos, viu-se novamente golpeada. No dia 12, ocorreu o desastre do avião DC-3, prefixo PPLPG, das Linhas Áreas Paulistas, que caiu no Rio do Sal, a 3 km. de Aracaju, falecendo toda a tripulação e passageiros. Entre estes estavam sua mãe, D. Maria Sampaio de Melo, o irmão Marcílio e a irmã Tereza Maria. Também faleceu naquele desastre o governador do Rio Grande do Norte, Dr. Dix-Sept Rosado, e outras autoridades daquele Estado.



O tempo passa



Parecia que o ingente esforço e sofrimento de Napoleão Laureano fora em vão.

Escolhido o local para a edificação do Hospital em sua homenagem, dado nome à rua em que ele deveria ser erigido, o dinheiro foi curto para a sua construção. Ou foi curta a memória das autoridades. Os patéticos apelos do nosso grande mártir já não repercutiam.



O Hospital Laureano não saía do chão. Aqui e acolá alguém alfinetava; o descrédito ia tomando parte da comunidade que tinha ainda vivo aqueles momentos de sofrimento comovente que alcançara as classes menos favorecidas.

As obras se arrastavam. Sempre atento, o deputado Janduhy Carneiro injetava dotações no Orçamento da República e graças a essas verbas foi possível realizar o sonho de Napoleão Laureano.



A grande obra do mártir



Onze anos depois do falecimento do grande mártir, em 24 de fevereiro de 1962, foi inaugurado o Hospital do Câncer Napoleão Laureano.

Estiveram presentes o governador Pedro Gondim, o ministro Estácio Souto Maior, da Saúde, o deputado federal Janduhy Carneiro, presidente da Fundação Laureano, o médico Antônio Carneiro Arnaud, primeiro diretor do Hospital, entre outras autoridades.

O Hospital Laureano, hoje dirigido pelo Dr. João Simões, é um estabelecimento muito bem aparelhado e tem prestado relevante serviço nessa área, comparando-se aos melhores do país, sendo o melhor do Nordeste.

O sonho de Napoleão Laureano, afinal, realizou-se.
















1Texto publicado no jornal A UNIÃO, de 19.06.51, p. 5.