Fundado em 7 de setembro de 1905 Declarado de Utilidade Pública pela Lei no 317, de 1909 CGC 09.249.830/0001-21 - CEP 58.013-080 - Rua Barão do Abiaí, 64 - João Pessoa-Paraíba |
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12º
Tema A IMPRENSA NA PARAÍBA Expositora: Fátima Araújo A fala do Presidente: Convido para participar da mesa a
jornalista Fátima Araújo, nossa confreira; deveria estar conosco o jornalista
Antônio Costa, Redator-chefe de A UNIÃO, e presidente da Associação Paraibana
de Imprensa. Por motivo de saúde, aquele companheiro comunicou-nos sua
impossibilidade em comparecer, o que lamentamos. A expositora, jornalista Fátima
Araújo, é sócia do nosso Instituto; é graduada em Letras e Comunicação Social
pela Universidade Federal da Paraíba; possui curso de especialização em
Comunicação Educacional (URNE, Campina Grande); tem vários cursos de extensão
universitária, inclusive sobre Literatura Brasileira; é portadora de curso de
francês premier e deuxiéme degré, pela Aliança Francesa; fez ainda os cursos sobre Problemas
do Desenvolvimento Brasileiro, em São Paulo e Caruaru; curso de Psicologia da
Personalidade, pela Fundação Pe. Ibiapina e o curso de Noções de
Biblioteconomia, pela UFPB. Participou
de vários Seminários. Fátima é jornalista militante,
tendo atuado na imprensa paraibana em todos os jornais, e atualmente mantém uma
coluna semanal no CORREIO DA PARAÍBA. Historiadora, pesquisadora, tem vários
livros publicados, cumprindo-me destacar os seguintes: HISTÓRIA E IDEOLOGIA DA
IMPRENSA NA PARAÍBA, 1983; HISTÓRIA DA API, 1985; PARAÍBA, IMPRENSA E VIDA,
(ensaio que foi premiado no IV Centenário da Paraíba), 1986; PARAHYBA 400 ANOS,
1985; SANTA ROZA – UM TEATRO CENTENÁRIO, 1989; ANTÔNIO MARIZ – A TRAJETÓRIA DE
UM IDEALISTA, 1996; e HUMBERTO LUCENA – O VERBO E A LIDERANÇA, 1999. Este é o perfil da nossa
expositora de hoje, que há treze anos pertence ao quadro de sócios efetivos
deste Instituto. Passo a palavra à jornalista
Fátima Araújo, para falar sobre o tema de hoje, que é A IMPRENSA NA PARAÍBA. Expositora: Fátima Araújo (Sócia do IHGP, da União Brasileira de Escritores,
seção da Paraíba, da Associação Paraibana de Imprensa, da Academia Feminina de
Cultura e da Academia de Letras Municipais do Brasil, seção da Paraíba). Devo dizer que não vou discorrer sobre a História
da Imprensa porque é uma história imensa, pois o livro que escrevi sobre o
assunto – PARAÍBA, IMPRENSA E VIDA - tem 407 páginas. Darei uma visão geral,
uma visão panorâmica, falando mais em nível de conscientização e ideologia, que
é um tema importante. Aproveito o ensejo para mostrar a vocês o fac-símile do
primeiro jornal do Brasil e o primeiro da Paraíba. Alcançando as condições essenciais
para o seu amplo desenvolvimento através da evolução dos processos
tipográficos, como da especialização dos profissionais em termos mais recentes,
a imprensa brasileira hoje está capacitada para formar e informar a comunidade,
não obstante o analfabetismo ainda alto, as falhas do ensino e a falta de
condições financeiras do nosso povo, causas que reduzem o acesso aos jornais,
infelizmente. Escamoteamento à parte, os filtros, a ideologia dominante, que
existe na imprensa, mesmo assim nosso povo ainda se interessa pelos jornais. Escamoteamento à parte, quer para
driblar as amarras da censura, quer para garantir os interesses das empresas
jornalísticas, o fato é que, em princípio, a imprensa visa alcançar o fim ideal
da promoção do bem comum. Quando falo aqui em imprensa, me refiro aos
jornalistas e não empresas. As empresas jornalísticas têm outra ideologia; elas
querem apenas dinheiro, querem apenas agradar os anunciantes, não estão nem um
pouco interessadas em informar a opinião pública. Mesmo assim, alguns
jornalistas passam por cima de tudo e forjam algum processo nesse sentido. Se este interesse pró-comunidade é
desviado no limiar de sua intenção e os profissionais de imprensa vêem-se às
voltas com a preservação dos interesses das empresas jornalísticas, em prejuízo
da comunidade, isto é realmente lamentável. A liberdade de imprensa, como
qualquer outro tipo de liberdade, sofre restrições e condicionamentos. Em
alguns períodos estanques da nossa história foi a censura aplicada com a maior
severidade, como vocês sabem, durante as duas ditaduras: a de Getúlio Vargas e
a ditadura militarista de 64. Esses foram os períodos piores da imprensa,
intimidando os jornalistas, formadores da opinião pública. Isto aconteceu
várias vezes, não só no Brasil, mas noutros países da América do Sul, como no
Chile, na Argentina e no Uruguai. E não se vá pensar que o mundo desenvolvido
das grandes potências esteja livre das amarras e dos condicionamentos. Basta
que tomemos o exemplo dos Estados Unidos. Há uma rivalidade entre leitores e
anunciantes, cada qual querendo tomar para si o jogo da imprensa. E quando essa
imprensa deixa se escravizar de mais pelos interesses dos anunciantes os
leitores a desprezam, numa maneira de forjar a sua responsabilidade
político-social. Na verdade, não podemos comparar o
caso dos Estados Unidos, onde mais de 95% da população é alfabetizada, com o
Brasil. O bom senso nos diz que o nível de desenvolvimento de uma nação influi
enormemente na conscientização do povo. Principalmente se esse povo é amainado
no processo de democratização. No caso de países desenvolvidos, detentores de
problemas sociais em bem menor escala, geralmente as massas não só
alfabetizadas, mas também politizadas, conscientizadas, exigem, por sua vez,
uma maior eficiência do sistema de informação. O que infelizmente não acontece
no Brasil. No Brasil, nós somos bem mais condicionados; devido ao poder
econômico, nossa imprensa é muito amordaçada e muito limitada em termos
econômicos, políticos e ideológicos. Por que? Porque além de não sermos
conscientizados ainda, não temos os recursos que eles têm. No Brasil, como noutras partes do
mundo, onde a imprensa desenvolveu-se na medida em que também se desenvolveu o
capitalismo, as limitações econômicas têm sido tão fortes quanto as políticas.
E o percentual esclarecido da população não está alienado, nesse sentido.
Capta-se, condena-se, rechaça-se esses condicionamentos políticos, econômicos e
ideológicos a que se submete a imprensa, porque dela depende, acima de
tudo, o registro torpe ou verdadeiro da
história e da nossa língua. Mas, infelizmente, não podemos fazer nada. Imprimindo as aspirações
coletivas, os jornais registram as mutações semânticas, as ocorrências, daí que
se exige uma imprensa livre, conscienciosa, que jogue limpo com a opinião
pública. Por isto lamenta-se a detectação, nessa mesma imprensa, de nuances
ideológicas pouco animadoras. Isto porque estão pouco comprometidas com a
verdade e com as mutações que o decurso da história exige. A observação é válida para a
imprensa de todo o Brasil, quase sempre acoplada ao aparelho político-jurídico
do Estado, no sistema vigente. Em nível de Paraíba, mais especificamente, a
ideologia da imprensa continua sendo, de maneira geral, a dominante,
circunstância que não vai mudar tão cedo. Ou, talvez, jamais, a não ser que
mude o curso da história política deste país, com o povo deixando escapar o
grito de liberdade que há muito está preso em sua garganta. Só um parêntese. É comum as
pessoas condenarem os jornalistas, dizendo: esse jornal não é nem oficial, é
oficialesco. Ouvi comentarem, outro dia, que num dia só saíram dez fotos do
governador Maranhão, dez fotos de Vilma Maranhão, e assim por diante. É porque
nossos jornais dependem economicamente, politicamente, ideologicamente. Não
somos nós, os jornalistas. Como técnicos, às vezes trabalhando em assessorias
do governo, fazemos a imagem do governo. Como técnicos nós escrevemos,
redigimos as matérias e as lançamos; mostramos para a opinião pública o que
governador tal fez, o que o deputado fez, construiu aqui e ali. Claro, como
técnicos nós fazemos. Como o médico consulta seu paciente e passa o remédio
tal. Nossa ideologia, a gente leva para
onde vai. Não deixa em casa, nem dentro da bolsa. A gente tem essa ideologia.
Claro que a gente não vai poder usá-la toda vida, porque nós dependemos. Nós
não temos dinheiro para fazer uma empresa jornalística e muitos que se lançaram
nessa empreitada acabaram sucumbindo. No passado, tivemos muitos jornais que
foram empastelados, incendiados. Jornalistas que levaram surras, foram presos,
levaram tiros, e assim por diante. Eu conto isso no meu livro. Naquela
época as pessoas eram mais idealistas, hoje, não; o consumismo tomou conta de
tudo, invadiu todos os lares através da imprensa falada e escrita, através da
televisão, através da indústria cultural. Então as pessoas estão mais
consumistas e fica difícil sair desse esquema, desse sistema tecnológico. Mas,
no passado, eram mais idealistas. E o que foi que aconteceu? Sofreram, muitos
foram até assassinados., como vocês sabem. A partir de 1826, quando se fundou
o primeiro jornal do nosso Estado – GAZETA
DO GOVERNO DA PARAÍBA DO NORTE – registrou-se na Paraíba uma história bonita de
periódicos ecléticos e ideológicos, quase sempre fundados com garra e
idealismo. Posso mostrar a vocês um fac-símile do primeiro jornal da Paraíba,
editado em 29 de agosto de 1826 e o primeiro jornal do Brasil, que é a GAZETA
DO RIO DE JANEIRO, de 10 de setembro de 1808, cujos fac-símiles constam de meu
livro citado. Verificando todo esse passado até os dias atuais; digo até os
dias atuais, mas já faz alguns anos que eu terminei meu trabalho, mas pesquisei
até cinco anos passados. Fiz pesquisas posteriores, que poderiam caber na sua
segunda edição. Aliás já está numa terceira
edição, só que as pessoas no nosso Estado não se interessam. É mais fácil se
interessarem por beleza, aniversários, festinhas, do que fazer trabalho da
reedição de um livro. Infelizmente os estudantes de comunicação precisam de
mais do livro e vivem lá em casa me aperreando. Já criei uma sala de pesquisas
só para os estudantes de comunicação. Ninguém se interessa em reeditar o livro.
Estou falando de todas as instituições, inclusive a Universidade. Mas eu também
não vou chorar lá nos pés deles. Eles façam se quiserem, venham a mim se
quiserem reeditar o livro, se puderem. Não vou me humilhar. Sinto muito, ajudo
como posso os estudantes, colocando parte de minha casa à disposição deles. Como estava dizendo, verificando
esse passado no estudo diacrônico e apurado que fiz, senti, com certa tristeza,
que da imprensa apaixonadamente opinativa do princípio nós involuímos para um
tipo de imprensa mais reservada e acanhada de manifestação. Dentro desta seara
controvertida enquadram-se os editoriais dos nossos periódicos, quase sempre
desfigurados, sem o sentido primeiro proposto pela verdadeira comunicação. Nas
opiniões que expressam, estas peças opinativas deixam transparecer a ideologia
dominante de acoplamento ao poder, seja ele político ou econômico. Como vocês sabem, estou apenas
realçando os editoriais dos jornais, que é uma peça importantíssima do jornal,
é a opinião do jornal. Elas vêm sempre sem assinatura, mas é do editor do
jornal. É peça opinativa de grande valor, até para a seriedade da empresa.
Antigamente a gente verificava no jornal do século passado A IMPRENSA, órgão da
Diocese, editoriais belíssimos. Muitas vezes eles questionavam os atos
políticos, o que se fez e o que se há de fazer nesta terra. Muitas vezes até
ajudavam os governantes. Os governantes precisam de críticas para melhorar. O
que acho mais triste é que os governantes procuram castrar a imprensa, pensando
que é bom para eles. Gostam daquele confete jogado o tempo todo em cima deles.
O interessante é deixar que a imprensa fosse como já foi, bem apaixonada,
ideológica, questionando os atos públicos. O que se vê hoje são editoriais bem
neutros. Não obedecem ao critério da proximidade. Quando eles não podem
questionar algo que está mau no Estado, eles se referem a um tema bem
universal. É uma maneira de fugir da proximidade, escapando de questionar ou
criticar os governantes próximos, para não serem atingidos. Até certo ponto é compreensível a
alegação do trauma causado pelo empastelamento das nossas folhas, como
aconteceu no passado, que destruíram com requintes de perversidade e da mais
pura maldade, pelos poderes constituídos. As pessoas sofreram muito e hoje não
estão a fim de apanharem tanto. Mas, não deviam ir tão longe, deviam ter mais
um pouco de coragem. Aliás, vez por outra a gente vê um jornalista ou outro
corajoso. Vez por outra sai um jornalzinho corajoso. Sai uma pecinha corajosa
dentro dos próprios jornais menos corajosos. E a gente aplaude isso aí. É bom
sempre a gente questionar, porque se a gente não questionar vai ficar um doce
só, um confete só, um negócio chato até de ler. A gente fica logo enojado; tem
jornal que não dá coragem nem de abrir. É uma alienação total, falta de
conscientização. Não queremos isso para o nosso Estado. Queremos é sair desse
analfabetismo, baixar o seu índice e melhorar a nossa conscientização. Nós
somos comunicadores para isso. Que é comunicador? Comunicador é aquele que faz
pensar, leva o outro a pensar, a crescer, a evoluir. Mesmo a suspensão pacífica dessas
folhas, com prejuízos morais e materiais para seus dirigentes, repercutiu muito
nos meios intelectuais, mas não justifica baixar a cabeça e deixar de
questionar. Não devemos nem olhar para esse passado. E se olhar, olhar com
coragem. A perseguição aos jornalistas nos
momentos ditatoriais ainda hoje repercute no mundo pensante não só da Paraíba,
mas de todo o país. É compreensível, sim, tudo isto, mas que não se venha
justificar nossa mudez, ou o temor ao questionamento, que não se venha
justificar o nosso esquecimento como comunicadores da grande responsabilidade
político-social que abraçamos. Na capital, nós temos três jornais
vivos, no momento. São eles: A UNIÃO, que foi fundada em 3 de fevereiro de
1893, que é o mais antigo; O NORTE, que é do dia 7 de maio de 1908, o segundo
mais antigo; e o CORREIO DA PARAÍBA, que é do dia 5 de agosto de 1953. São os
três principais em circulação. Um oficial e dois privados, mas que uma vez ou
outra apresentam nuances que deixam a questionar. Se eles não têm pedaços
oficialescos, como acabei de mostrar, é por conta dos condicionamentos
políticos, ideológicos e econômicos. Um jornal que seria interessante
citar para vocês é o jornal da Diocese – A IMPRENSA. Em 1897 surge esse jornal,
quatro anos depois de A UNIÃO. Era um jornal católico doutrinário, noticioso,
que possui importância na imprensa paraibana e merece um estudo mais apurado.
Foi um órgão de projeção, que marcou época. Foi fundado em 27 de maio de 1897
por D. Adauto Aurélio de Miranda Henriques, 1º Bispo e 1º Arcebispo do nosso
Estado. O primeiro redator-chefe foi o padre José Tomaz, que trabalhava em
conjunto com outro religioso, Manoel Paiva. Este jornal teve grande aceitação
por parte da opinião pública. Era um jornal corajoso e trazia editoriais
belíssimos, peças opinativas e também reportagens interpretativas bastante
recheadas, e para a época foi considerado um jornal maravilhoso. Além da grande
aceitação, ele teve um papel relevante para a nossa sociedade. Foi despertando
a ira de alguns políticos, aqui e acolá saía de circulação, entrava em eclipse,
por falta de recursos, por falta de apoio, tudo por conta de pressões. Até que
na década de 60 ele fechou para sempre. Estão lá somente as coleções
arquivadas, no arquivo da Diocese. A maioria dos jornais foi efêmera. Houve jornal de sair apenas um
número. Alguns duravam mais, mas a grande maioria dos jornais teve vida
efêmera. As causas principais eram falta de recursos e o baixo índice de
analfabetismo, como já falei aqui. Não vou me deter sobre todos esses
jornais porque seria enfadonho. · · · A fala do Presidente: Ouvimos a exposição da confreira
Fátima Araújo, que em pinceladas rápidas referiu-se à importância da Imprensa,
examinando seu conteúdo ideológico. O atrelamento do profissional ao
condicionamento promovido pelas empresas jornalísticas e a subserviência das
próprias empresas submetidas às pressões do poder econômico e do Estado foram
abordadas corajosamente pela expositora. O quadro por ela apresentado na
Paraíba, conforme confessou, é um quadro nacional. Não somos os únicos a sofrer
aquelas pressões. Mas, com entusiasmo, Fátima Araújo profliga esse
comportamento do comunicador profissional. A ilustre expositora lembra,
também, uma das coisas mais perversas que ocorrem na vida jornalística, que é a
censura. Censura que se exerce das formas mais aviltantes, como é o caso dos
empastelamentos dos periódicos, por ela citados. Esse tipo de censura é o mais
violento. É realmente uma das piores coisas
que podem acontecer com a imprensa. A Paraíba nunca ficou isenta dessa mancha.
No passado tivemos problemas sérios, até durante o Império. A censura não dá
chances à conscientização que a palestrante questiona aqui com certa veemência. Na minha vida profissional na
imprensa, quando trabalhei no jornal A UNIÃO, entre 1941 e 1944, conheci a
força do Departamento de Imprensa e Propaganda do Estado Novo, de Getúlio
Vargas. Era o famoso DIP. Aqui na Paraíba era DEIP – Departamento Estadual de
Imprensa e Propaganda. Martha Falcão, em aparte.: Esse DEIP já existia no governo de
Argemiro de Figueiredo. Ele foi criado dois anos antes do criado por Getúlio. Luiz Hugo Guimarães, retomando a palavra: Essa eu não sabia e agradeço a
informação da confreira, que sei expert sobre o Governo de Argemiro de Figueiredo,
sobre o qual tem um estudo completo. Mas o fato é que só me deparei com
esse DEIP naquela oportunidade em que era funcionário de A UNIÃO, entre 41 e
44. O interventor era Ruy Carneiro, que assumira o Governo da Paraíba em 1940.
O que Ruy conseguiu com seu prestígio junto a Getúlio Vargas foi colocar em sua
direção um civil, o Dr. João Gonçalves Toscano de Medeiros. E a Paraíba foi o
único Estado que teve, naquela ocasião, um civil na direção daquele órgão. Nos
outros Estados ele era chefiado por um militar. O Diretor Geral do DIP era o
capitão Amílcar Dutra. Apesar de Dr. João Medeiros se tratar de um homem de
bem, intelectual, médico renomado, sempre houve atritos entre o órgão oficial e
aquele Departamento. Era diretor de A UNIÃO o jornalista Ascendino Leite e
Secretário Geral o jornalista Octacílio Nóbrega de Queiroz. O DEIP funcionava
no prédio do atual Palácio da Justiça, na ala esquerda do lado da rua da
Palmeira, onde anteriormente esteve instalado o Tribunal Regional Eleitoral.
Toda a matéria elaborada tinha que ir para lá a fim de passar pela censura. O
que passava sem censura eram as notícias favoráveis ao Governo, aos aliados da
grande guerra. Mesmo assim havia uma fiscalização para não escapar nada de
mais, pois na redação havia alguns germanófilos. Ascendino Leite, apesar de se
dar bem com João Medeiros, se constrangia bastante com aquela situação. A
redação, portanto, sob censura, nos constrangia. Lembro-me do acontecido com o
jornalista Natanael Alves, grande jornalista, que era o editorialista de O
NORTE, e certa vez redigiu um editorial que não agradou a direção do jornal.
Ele foi simplesmente substituído, foi dispensado do jornal, o que foi lamentável. Isso me fez lembrar que em certa
época dos anos 70 fui o editor do JORNAL DE AGÁ, na primeira fase daquele
jornal de sociedade. O jornal de Heitor Falcão era composto e impresso em a A
UNIÃO, desde o governo de Ivan Bichara e passou para o governo de Tarcísio
Burity. Tínhamos um colunista de Campina Grande – Wiliam Tejo – que escrevia
sobre política. Na sua coluna ele vinha soltando umas letrinhas que não
agradara ao governador. Cheguei a ouvir uns comentários falando para eu prestar
mais atenção à coluna de Tejo. Já existiam pressões sobre os “causos” que José
Cavalcanti contava em sua festejada coluna PAPO FURADO. O interessante é que as
mulheres da sociedade, que hoje têm o apelido de socialite, reclamavam das irreverências aos seus maridos, mas eram
as primeiras a lerem a coluna de Zé Cavalcanti. Era uma censura velada. Num sábado, estava acabando de
fechar o jornal quando fui chamado à Diretoria de A UNIÃO. Fui lá e encontrei
Natanael Alves, que era o Superintendente, e Gonzaga Rodrigues, que era o
Diretor Técnico. Natan, como nós o chamávamos, Natan disse: já vimos o artigo
de Tejo que vai sair amanhã e sugiro que você tire o artigo para não criar
problemas, se não o jornal não vai mais poder sair aqui na A UNIÃO. Foi claro.
Mas notei que seu semblante era lívido. Não me contive. E disse-lhe: estou
impressionado com você e Gonzaga Rodrigues. Como é que vocês vêm me pedir para
fazer censura no jornal? Você não se lembra que saiu de O NORTE por isso? E
vinham as evasivas: você compreende, isto é um jornal oficial. Também fui
incisivo. – Quem mandou fazer essa censura foi Burity? Interessante é que há
poucos dias Burity dera uma entrevista elogiando a liberdade de imprensa.
Indignei-me, mas não censurei o jornal do qual era o editor. Também foi o último
número editado na A UNIÃO. Isto é a CENSURA Há muitos casos de que fui
testemunha ocular, mas que não cabe neste debate relatar. Esses exemplos já são
o bastante. O jornalismo é uma das profissões
mais difíceis de se exercer sem contrariar os princípios do profissional, da
sua formação. E há uma coisa pior que a CENSURA. É a AUTOCENSURA. Trabalhando
sobre a pressão do empresário que controla a política do grupo empresarial do
dono do jornal, política de interesses econômicos e até partidários, com n + k recomendações, restrições, etc. o
jornalista começa a se marginalizar, a se indefinir, a se duvidar. Devo dizer
isso, ou não? O profissional mutila seu pensamento, sua vocação vai para o
brejo. Lembro-me também dum episódio
ocorrido por ocasião da visita do presidente Geisel à Paraíba. Era Secretário
de Comunicação nosso confrade Hélio Zenaide, com quem sempre mantive excelente
camaradagem, como ainda hoje. Hélio até mantinha no JORNAL DE AGÁ uma seção
intitulada RONDA DOS ARQUIVOS, uma excelente coluna onde ele liberava seus
arquivos implacáveis e bem cuidados. Hélio me chamou e disse que tinha incluído
meu nome no rol dos jornalistas que participariam do evento. Conseguimos fotos
do arco da velha do general Geisel, no tempo em que ele era tenente e foi Secretário
das Finanças no Governo de Anthenor Navarro. Preparamos um caderninho especial.
No Hotel Tambaú estive com a equipe do Jornal do Brasil, que veio fazer a
cobertura da visita. Forneci-lhe até alguns subsídios e inclusive uma foto que
iria sair no jornal e que também saiu no Jornal do Brasil. Mas, isso não vem ao
caso. Quando foi na véspera da chegada de Geisel, Hélio Zenaide chamou-me para
dizer: seu nome foi vetado para a visita de Geisel. Não fiz cara feia, era o
esperado. É natural, eu era um cidadão cassado pelo golpe de 64. Estou registrando esse fato só
para complementar a força da censura. A “fala do Presidente” hoje foi
além do habitual, que se cinge sempre a um pequeno comentário sobre os debates.
Mas, aproveitei a ausência do debatedor oficial, para tecer algumas
considerações objetivas, tentando complementar a oportuna exposição de Fátima
Araújo sobre o valor da conscientização na imprensa. Aliás, se vocês quiserem conhecer
a evolução da nossa imprensa não há outra saída senão ler os trabalhos de
Fátima Araújo. Se bem que sejam livros esgotados, o Instituto os tem em sua
biblioteca à disposição dos interessados. Vamos ceder, agora, a palavra aos
participantes. · · · 1º participante: Guilherme d’Avila
Lins: Referindo-me à fase de censura da
última ditadura, a de 1964, eu me lembro
que no ESTADO DE SÃO PAULO havia um movimento de resistência que na
primeira página, quando a notícia não podia ser dada, eram publicados receitas
de bolo, ou um poema de Camões. Era a resistência possível. O que eu queria
saber é se na Paraíba, naquela época, houve esse nível de resistência possível. Fátima Araújo: Houve, de mais, até. Muitas vezes
o jornal estava quase todo pronto e durante a madrugada os censores invadiam o
jornal e obrigavam a tirar imediatamente a tirar uma notícia., tapar o buraco
com qualquer matéria. Luiz Hugo sabe disso. Um censor lia a matéria e o outro
ia dizendo: tire isso, tire esse pedacinho, tire toda. Marcus Odilon, aparteando: Em 1985, na campanha municipal, a
censura era tão grande que o CORREIO DA PARAÍBA e O NORTE apareciam com espaços
vazios. Tratava-se de matéria eleitoral, com respostas necessárias. Fátima Araújo: Às vezes a censura era feita em
cima da hora, não dando tempo para a colocação de uma matéria no espaço, que
assim ficara vazio. 2º Participante: Jeová Mesquita: Minha mulher tem muita raiva
quando vou fazer um curso. Mas eu adoro fazer curso. Certa vez fui fazer um
curso de tiro ao alvo no stand da Polícia Militar. Meu companheiro de curso foi
o jornalista Paulo Brandão. Na última aula, diante do alvo, atiramos. Ele
gostava de andar com o revólver na meia. Como vocês sabem, Paulo Brandão era um
empresário e um dos donos do jornal CORREIO DA PARAÍBA. Uma semana depois de
terminado o curso, doutora Fátima, ele ia saindo da sua empresa, ali na estrada
do Recife, quando foi metralhado dentro do carro. Já estavam à espreita de
Paulo Brandão. Dizem que foi uma conseqüência do que o jornal CORREIO DA
PARAÍBA vinha publicando contra o Governo do Estado. Então eu queria perguntar
à ilustre palestrante se ela tem alguma informação do motivo porque esse
diretor de imprensa foi metralhado assim, uma coisa tão absurda. Até hoje
ninguém sabe porque essa violência contra esse moço. O primo dele é hoje um
próspero empresário, que era sócio dele. Fátima Araújo: Eu creio que essa dúvida jamais
será esclarecida. É um problema de polícia e até hoje fizeram mil investigações
e como as pessoas envolvidas eram e continuam sendo muito poderosas, então
penso que não vão ser esclarecidas jamais. Acho muito difícil, não que o crime
seja perfeito. Deve haver quem saiba e acho que houve até testemunha, mas não
vai ter coragem de falar, jamais, mesmo porque serão outras vidas que serão
perdidas. Mas, houve também problema pessoal, não foi somente de imprensa.
Porque aquele jornalista freqüentava a casa de alguns que estariam
possivelmente envolvidos. Houve também uma história que alguém deu um tapa no
rosto de alguém, segundo ouvi no nosso jornal. Não foi só motivo de imprensa,
houve coisa pessoal, intrigas, picuinhas, antipatias. Só a polícia pode
esclarecer isso, um dia, ou nunca. 3º participante: Marcus Odilon: A UNIÃO começou como órgão do Partido Republicano, depois passa
para o Estado. Como foi feita essa transação? Porque não foi bem explicado,
ficou assim como segredo de confissionário. O Partido Republicano, que à época
pertencia a Álvaro Machado, recebeu um gordo dinheiro de indenização ou se foi
porque o jornal estava falido e o Governo do Estado socorreu. Há alguma explicação
para isto? Fátima Araújo: Não, apenas o Governo abraçou o
ideal do jornal, ficou com o jornal. Dizem que Álvaro Machado recebeu essa
gorda quantia que você está falando, mas nunca ficou registrado. Conforme o
participante registra, é um assunto questionável. 4º participante: Martha Falcão: Nossa história tem muitas lacunas
e precisa ser trabalhada nesse assunto. Um desses aspectos lacunosos é o
período da imprensa durante as interventorias. Esse período das interventorias
é muito pouco trabalhado, mesmo nos cursos. Estuda-se a República Velha,
estuda-se a República Oligárquica e se dá um pulo para depois do Estado Novo.
Não é somente em relação à Imprensa. Mesmo o trabalho sobre a imprensa, e um
dos melhores trabalhos é o da expositora de hoje, é pouco estudado entre 30 a
40 e aí vamos encontrar um censura muito forte na interventoria de Anthenor
Navarro. Existe um confronto entre a questão da reconstitucionalização do país
e da não reconstitucionalização. No primeiro momento, quando os tenentes estão
no poder, eles julgam que se o Brasil se constitucionalizar as oligarquias vão
voltar ao poder. Então lutam com todas as suas forças. Nesse momento existe um
jornal aqui de ex-epitacistas que vão fundar o Partido Republicano Libertador,
liderados pelo grande Boto de Menezes, juntamente com Joaquim Pessoa, que
também rompe com Anthenor Navarro, vamos ver que o próprio Tancredo de Carvalho
funda um jornal muito forte – BRASIL NOVO. Ele surge em Campina Grande e depois
vem ter sede em João Pessoa. Esse jornal prega a reconstitucionalização do
país, e é invadido pela polícia da capital, cujo chefe era um dos nossos
consócios daqui, que foi um grande professor de Direito do Trabalho, que era
Clóvis Lima. Manoel Moraes, que foi Chefe de Polícia também andou perseguindo
jornais. O jornal A LIBERDADE, dirigido por Aderbal Piragibe, também foi
perseguido. Durante a interventoria de Anthenor Navarro, essa perseguição foi
muito forte. A partir do momento que Getúlio Vargas firmou um acordo com os
derrotados da Revolução Constitucionalista de 32, as antigas oligarquias
derrubadas lideradas por São Paulo, vamos ver que a situação muda. A UNIÃO
passa, não a combater a reconstitucionalização do país, mas passa a apoiá-la,
porque agora o governo provisório está apoiando. É o caso do conteúdo do jornal
A UNIÃO. Até a entrada do Brasil na guerra, A UNIÃO, como a A IMPRENSA, é um
jornal totalmente anticomunista. É um jornal que fala no perigo vermelho toda
hora. Existiam colunas de propaganda totalmente declarada pelo integralismo no
jornal A IMPRENSA, que era um órgão de propaganda clara pró-integralismo. Nós
tínhamos vários municípios onde foram fundados núcleos da AIB, inclusive
Pirpirituba, Campina Grande, Santa Rita. O núcleo de Santa Rita chegou a juntar
150 pessoas associadas, inclusive o Presidente de Honra foi o Dr. Virgínio
Veloso Borges, dono da fábrica; Dr. Manoel Veloso Borges foi escolhido como
orador. Houve um comício muito grande na praça de Santa Rita, acabando com os
donos das usinas, porque era o confronto entre os aliancistas e os perrepistas.
E a imprensa publica trabalhos enaltecendo o bloco que está no poder. A UNIÃO, órgão
do governo, segue a linha de Getúlio Vargas. À medida que o Brasil entra na
guerra, que vai se ombrear ao lado da União Soviética, o jornal muda de
posição. De 1935 a 40 vamos ter o governo
de Argemiro de Figueiredo e dentro desse período vamos ter a intentona
comunista. Neste momento a imprensa publica os relatórios do delegado de
polícia da capital, no caso era Praxedes Pitanga. E aqui na Paraíba há uma
espécie de farsa para se fazer um movimento no sentido de que aqui também havia
muitas células participativas do movimento. Depois a história mostra que era
mais uma farsa. Há um inquérito, as pessoas são presas, são torturadas, o livro
SANTA CRUZ E O JORNAL DO POVO está aí. Mas isso precisa ser muito trabalhado,
em nível específico sobre o papel da Imprensa no Estado Novo. É uma das lacunas
existente na História da Paraíba. Há muita coisa rica tanto em A UNIÃO como no
jornal A IMPRENSA e jornais como BRASIL NOVO, de Tancredo de Carvalho. Há até
um trabalho biográfico dele em que ele mostra toda a trajetória e o trabalho MINHA
TERRA, de Bôttto de Menezes, que também tem muita coisa sobre a Imprensa. Era só essa a contribuição que
queria dar. 5º participante: Maria do Socorro
Xavier: Quero parabenizar a exposição de
Fátima, não só sua palestra, mas o livro dela, que resgata muito bem a Imprensa
na Paraíba. Gostaria de perguntar a Fátima Araújo se na Imprensa paraibana não
houve um movimento no seio do próprio jornalismo para que essa liberdade de
imprensa se concretizasse ou pelo menos um protesto contra a castração da
liberdade de expressão plena nos periódicos paraibanos. Fátima Araújo: Não. Um protesto organizado, algo
formalizado, não houve. O protesto de todos os jornalistas, desde o princípio,
é perene. Os jornalistas vivem sempre forjando, tentando escrever mais,
tentando falar mais. Uma vez ou outra eles são podados, são ameaçados, Luiz
Hugo deu mil exemplos aqui. Os jornalistas são chamados a atenção, são
demitidos. Tudo isso é uma maneira de protestar. Estão sendo podados, mas por
trás estão protestando, vão tentando. Nós aqui que fazemos as pesquisas vamos
mostrando isso, mostrando a maneira de questionar, porque se não questionar será
pior. O protesto existe, existirá sempre. Muitas vezes um protesto aberto, não
tão velado. Movimento, assim como uma passeata, isso não houve. Existe no
dia-a-dia nas empresas jornalísticas. Existe ideologia, sim entre os
jornalistas, não entre as empresas jornalísticas. Protesto organizado não há.
Uma greve, nem pensar. Estão atrelados ao poder, não podem nem falar, nem
espernear. Vão perder o emprego. Luiz Hugo, tomando a palavra: A Associação competente, que é a
Associação Brasileira de Imprensa, tem sua importância, no Brasil. Herbert
Moses, que foi um dos presidentes que demorou mais tempo no comando da ABI, era
sempre ligado ou amigo dos governantes, mas havia momentos em que ele resistia
e dava pronunciamentos fortes, e brigava como ele tinha acesso às autoridades,
falava diretamente com os governantes. Há posições interessantes dele, como de
Barbosa Lima Sobrinho, também presidente da Associação Brasileira de Imprensa. Na Paraíba, quem dominou durante
muito tempo a Associação Paraibana de Imprensa – API, foi o jornalista José
Leal, nosso consócio. Durante quatro anos fui secretário da API, quando ele foi
presidente, e sou testemunha de quanto ele defendia o jornalista. Ele tinha
certa independência, não uma independência total, mas levava seus protestos aos
governantes. José Leal deixou a direção de A UNIÃO quando um erro de revisão
envolveu o nome da mulher de Ruy Carneiro e recebeu ordem para demitir todos os
revisores do turno. Dispensou-os, mas pediu demissão do cargo de Diretor. Foi
justamente quando Samuel Duarte, que era Secretário do Interior, nomeou
Ascendino Leite para diretor de A UNIÃO. As posições de José Leal eram de
centro-direita, um liberal, e chegou a pertencer à Esquerda Democrática. Mas
quando acontecia um caso com um jornalista, mesmo que ele fosse comunista, ele
defendia com unhas e dentes a situação do companheiro. Era intransigente na
defesa do jornalista. Em 1964, quando Adalberto Barreto
era presidente, a API andou convocando reuniões, fazendo chamamentos, mas não
tinha como, pois a metade já estava presa e o resto estava no meio do mundo.
Mas, não foi propriamente a posição da Associação, foi de um grupo ideológico. 6º participante: Odilon Ribeiro
Coutinho, membro
do Conselho Estadual de Cultura: Como Cristo, eu vim para
confundir. Vim para agitar um pouco. Até porque eu acho que esses Seminários só
valem na medida em que provocam agitação, um debate e até paixão. Não tive a sorte de chegar aqui a
tempo de ouvir a palestra de Fátima
Araújo. Tive um compromisso a que não pude faltar, prestou-se uma homenagem ao
Dr. Eurípedes Tavares, que foi mais de 30 anos Secretário do Tribunal de
Justiça e eu sou seu conterrâneo estrito, porque ele nasceu no Engenho Central,
a poucos metros da casa onde nasci. Dr. Eurípedes era pai do sócio deste
Instituto, Monsenhor Eurivaldo Tavares. Perdi a oportunidade e me frustro por
isso de deixar de ouvir Fátima Araújo.. Mas gostaria de dar um pequeno
depoimento a respeito da história da Imprensa na Paraíba. Dizem que o diabo é
temível, não por ser diabo, mas por ser velho. Porque já viu muita coisa,
aprendeu muita coisa, acumulou muita vivência, muita experiência. E é isso que
quero trazer aqui, nesta reunião, no o intuito de contribuir um pouco para se
ver o papel desenvolvido pela imprensa neste século, já que estamos comemorando
no programa deste Instituto Histórico os 500 anos do Brasil. A imprensa na Paraíba surgiu nos
fins do século passado e teve uma grande atuação no começo deste século. Na
segunda metade do século, a partir do último terço da segunda metade, tenho a
impressão que o papel da imprensa foi um papel dócil, subordinado, sem
independência e sem personalidade. A imprensa geralmente tem uma
significação muito grande para o historiador. Não apenas o historiador, mas o
sociólogo, o antropólogo vão buscar na Imprensa elementos que atendem à sua
pesquisa e permitem chegar a conclusões nas suas respectivas áreas da maior
expressão e da maior significação. Gilberto Freyre, por exemplo, apoiou grande
parte das suas conclusões sociológicas nos anúncios de jornais, nos velhos
jornais centenários, no Diário de Pernambuco, que é o mais antigo jornal da
América Latina e de outros jornais do Império. Anúncios de escravos fugidos,
anúncios de comportamentos políticos, anúncios de partidos que adotavam certas
decisões e que refletiam nos jornais as decisões tomadas, tudo isso foi um
material muito importante usado por Gilberto Freyre. Do ponto de vista histórico, José
Antônio Gonçalves escreveu um trabalho sobre o Diário de Pernambuco e a
história pernambucana, que é um trabalho modelar. E aqui está uma especialista
que não me deixa mentir, que tem realizado um trabalho notável, inclusive tem
se arrimado em pesquisas feitas na imprensa. No fim do século passado tivemos
uma imprensa aguerrida. Logo depois da República, mas uma coisa muito
incipiente. No começo do século nós tivemos jornais de oposição que tinham um
admirável espírito de independência. Mas o jornal – a nau capitânea, como
costumo chamar – que orientou a mídia na Paraíba, desde os fins do século
passado, foi A UNIÃO. A UNIÃO foi uma grande formadora de jornalistas. Ainda
hoje eu imagino que a verdadeira Faculdade de Jornalismo na Paraíba é A UNIÃO.
Mas a A UNIÃO é um jornal sectário. Do ponto de vista histórico, o depoimento
de A UNIÃO é um depoimento suspeito porque foi um jornal sempre atrelado aos
interesses do poder. Não foi um jornal imparcial. Mesmo que não tivesse sido
imparcial, se porventura acolhesse algumas opiniões ou movimentos de oposição,
ele expressaria a verdade histórica da época. A UNIÃO ficava sempre a serviço
dos governos, como até hoje. Uma coisa interessante é que os governos estaduais
tinham os seus jornais logo depois da República. No Rio Grande do Norte houve
um grande jornal em que Luís da Câmara Cascudo colaborou intensamente, que foi A
REPÚBLICA. A REPÚBLICA durou até poucos anos atrás, depois foi fechada pelo
próprio governo do Rio Grande do Norte, que a manteve durante décadas. A UNIÃO é o único jornal oficial
que ainda sobrevive, um jornal a serviço da propaganda do governo e que está
sempre a serviço de interesses grupais. Por isso mesmo, é um jornal de
significação histórica relativa porque apenas reflete o ponto de vista de um
dos lados. A imprensa de oposição é que
permite fazer o equilíbrio entre as opiniões governamentais. Nas primeiras
décadas deste século havia uma aguerrida imprensa de oposição, que tinha
coragem e bravura cívica admiráveis. Hoje, isso tudo está completamente
abafado. Temos A UNIÃO, que a meu ver não consegue a eficiência que tinha antigamente.
No tempo, por exemplo, de um Carlos Dias Fernandes. No seu tempo A UNIÃO teve
um papel importantíssimo, inclusive na formação da mentalidade jornalística da
Paraíba, na formação de pessoal. Foi realmente o órgão universitário de que nós
dispúnhamos para a formação do pessoal dedicado ao jornalismo. E era um tempo
muito mais romântico, muito mais objetivo e muito mais verdade do que o de
hoje. Eu duvido muito da formação
universitária dos jornalistas e acho que é uma forma de corporativismo. Hoje o
homem que tem a vocação se não passar pela Universidade não tem acesso às
redações. É uma coisa que desfalca o jornalismo brasileiro de talentos
vigorosos. Nas primeiras décadas do século
havia um jornalismo de oposição que permitia estabelecer o equilíbrio entre as
opiniões da situação e as da oposição. E aí o historiador poderia navegar. Era
uma navegação que se fazia através de escolhos. Depois houve uma degradação.
Hoje acho que a imprensa está totalmente degradada. A UNIÃO não tem mais a
significação, a expressão de antigamente e os jornais existentes, todos eles,
se portam como empresas; estão a serviço de quem pagar mais. De modo que hoje é
muito difícil você chegar a algum resultado histórico válido se você se submete
à leitura dos jornais. Se pegarmos os jornais de dez anos atrás não vamos
chegar a um resultado histórico válido, porque os jornais, já naquele tempo se
subordinavam aos interesses imediatistas e faziam o jogo empresarial de quem
pagasse mais. A UNIÃO sempre expressa o ponto de vista do Governo com um
sectarismo exemplar, o que retira de A UNIÃO e retira dos jornais atuais
qualquer sentido de autenticidade histórica que permita ao historiador fazer a
sua navegação com segurança. De modo que se fizermos um balanço da imprensa
neste século o balanço terá de ser negativo. A imprensa está degradada. Não
temos mais aqueles românticos jornais do começo do século que se atiravam
contra o chamado poder constituído com uma valentia admirável e desinteressada,
arrostando, os jornalistas, todos os riscos, inclusive da prisão, das
represálias violentas e até do empastelamento do jornal. Isso tudo desapareceu.
E vivemos hoje melancolicamente um tempo de degradação. 7º participante: Joacil de Britto
Pereira: Também não tive a satisfação de
ouvir a exposição, que creio tenha sido brilhante, da ilustre confreira Fátima
Araújo, pelo mesmo motivo já apresentado na justificação de Odilon Ribeiro
Coutinho. Como adendo, informo que representei o Instituto Histórico na
homenagem prestada ao pai do nosso caro confrade Monsenhor Eurivaldo Caldas
Tavares. Não vou debater propriamente, não
vou contestar, mas gostaria de prestar aqui uma homenagem muito significativa
por si mesma, não por minhas palavras, aos jornalistas corajosos de antanho. A
Gama e Melo, que fundou A REPÚBLICA para combater a oligarquia de Álvaro
Machado, e com que bravura cívica, com que patriotismo, com que coragem
paraibana ele se portou. Também a Artur Aquiles, que dirigia O COMÉRCIO, que
pagou caro com o empastelamento do seu jornal diante da intolerância do poder.
Ainda a Antônio Bôtto de Menezes, diretor de O COMBATE, o único político que se
elegeu só pela capital, que era como um braço de mar bravio na oposição que
desencadeava contra o poder constituído de então e fazia a maré cheia e a maré
vazante, levando as multidões ovacionando para aplaudi-lo sempre, por sua
coragem e pelo seu destemor. Ainda a José Leal, que também teve uma atitude de
coragem, embora sobranceira, mas sempre permanente. Foi ele que aqui fundou a
Esquerda Democrática e o Partido Socialista Brasileiro, arrostando contra o
poder e contra seus próprios parentes, quando José Américo era o nosso emblema
maior de grande líder nacional, e parente bem próximo de José Leal. Esses
homens devem merecer a nossa homenagem no dia em que, neste Instituto, se fala
sobre a Imprensa na Paraíba. Foram grandes intérpretes das aspirações e das
inspirações populares de uma Paraíba brava e rebelde. Esta é a homenagem quero
prestar neste momento, pedindo a atenção e o apoio de todos os presentes.
(muitas palmas) · · · A fala do Presidente: Vou confessar a vocês que estava
protelando o encerramento do debate, justamente aguardando Joacil Pereira e
Odilon Ribeiro Coutinho. E para coroar a palestra da nossa confreira Fátima
Araújo, tudo isso que vocês disseram com tanta eloqüência e com vibração,
Fátima Araújo disse com a serenidade da
jornalista, da mulher que sabe dizer as coisas bem devagarzinho. Ela contou
aqui, em linhas gerais, esses problemas do jornalismo, do jornalista e das
empresas jornalísticas. O Instituto Histórico está cada
vez mais agradecido pela presença de vocês, quem vêm trazer seu contributo a
este nosso debate que fará, não tenham dúvida, na história deste Instituto um
dos seus pontos marcantes. Nós faremos, sem dúvida, os ANAIS
destes debates e daremos, com isso, uma contribuição à historiografia
paraibana. Agradeço a presença de todos. Está
encerrada a sessão.