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2º Tema Expositora: Rosa
Maria Godoy Silveira Debatedor: Marcus
Odilon Ribeiro Coutinho A
fala do presidente Luiz Hugo Guimarães: Dando
continuidade ao nosso Ciclo de Debates iniciado com grande aproveitamento com a
palestra da professora Regina Célia Gonçalves, iniciaremos esta segunda sessão
com a apreciação do tema A PARAÍBA DURANTE O IMPÉRIO, que será enfocado pela
professora da UFPB, doutora Rosa Maria Godoy Silveira, que convido para
participar da mesa dos trabalhos. Para
compor a mesa, convido o consócio Marcus Odilon Ribeiro Coutinho, que será o
debatedor designado para tratar do tema; convido também o acadêmico e consócio
Joacil de Britto Pereira, presidente da Academia Paraibana de Letras; convido o
vereador José Bernardino, da Câmara Municipal de Santa Rita, para fazer parte da
mesa; e, finalmente, convido o acadêmico Odilon Ribeiro Coutinho, membro do
Conselho Estadual de Cultura. Temos
a satisfação de apresentar aos presentes a professora Rosa Maria Godoy
Silveira, atual chefe do Departamento de História da UFPB; ex-pró-reitora da
graduação, da UFPB; ex-vice-presidente do Fórum Nacional de Pró-reitores de
Graduação; é mestra e doutora pela USP. Tem vários livros publicados e inúmeros
artigos em revistas especializadas. Tenho
a satisfação de passar a palavra à nossa ilustre palestrante de hoje. Expositora: Rosa Maria Godoy
Silveira (Mestra e Doutora em História, chefe do
Departamento de História da UFPB) Mais
uma vez, em nome do Departamento de História da UFPB e em meu nome, agradeço
minha participação nesse Ciclo de Debates, que reafirma nossa parceria com o
Instituto Histórico, cujos frutos têm sido bastante positivos durante a
administração do professor Joacil Pereira e do professor Luiz Hugo Guimarães,
quando concluímos a organização do acervo do IHGP. Sobre o tema que me foi proposto – A PARAÍBA
DURANTE O IMPÉRIO – nós optamos para fazer um pequeno texto, uma breve síntese
tentando entender algumas questões fundamentais do período imperial na Paraíba,
questões estas que se abrem ao debate. É vidente que não vou esgotá-las no
limite do tempo que me foi dado e no limite deste texto. Em
recente balanço sobre a produção historiográfica relativa à Paraíba imperial,
que foi um balanço que nós próprios fizemos num curso que está sendo ministrado
na Universidade constatou-se que este período tem sido um dos menos
pesquisados, senão o menos pesquisado da nossa história. O Império tem sido
sempre o pior período em matéria de pesquisa histórica. E é, com certeza, o
pior período da História do Brasil, em matéria de ensino de História. Deste
levantamento entre os cerca de 118 títulos levantados no Índice do IHGP, sobre
este recorte temporal, dois temas avultam em número de artigos: a Revolução de
1817 (que está na fase da transição) e a Escravidão/Abolição, enquanto, no
gênero biográfico predominam artigos sobre Pedro Américo. Consideramos, no entanto, que a compreensão da
História da Paraíba no Império passa por alguns grandes temas basilares, sem
desconsiderar a importância da micro-História. Tais temas são: os movimentos
liberais, a construção da ordem e a crise agrária. Por movimentos
liberais, entende-se o largo espectro entre a Revolução de 1817, passando
pela Confederação do Equador até a Revolução Praieira, em 1848, embora o
primeiro e os dois últimos movimentos se diferenciem pela própria mudança no
conteúdo do Estado no Brasil, decorrente do processo de nossa autonomia
política. Mas, em comum, todos esses três movimentos significam a luta contra
um modelo político centralizador. O espaço paraibano, tendo integrado o território
mais rico da Colônia, tendo vivenciado a experiência do invasor holandês, tendo
sido subordinado politicamente, durante 44 anos, a Pernambuco, já havia sido
profundamente espoliado de suas riquezas e de seus recursos financeiros. E a
espoliação continuava, com a chegada da Família Real, pois foi dos recursos
desta área geográfica, do depois Nordeste Oriental, que se pagava a indenização
portuguesa aos holandeses na sua expulsão dourada, que se sustentou a Corte do
Rio de Janeiro e que se custeou até mesmo o regresso de D. João VI a Portugal,
após a eclosão da Revolução do Porto. Todo
esse conjunto de processos em sua formação histórica explica a mentalidade
libertária presente na Paraíba, em articulação com o Rio Grande do Norte, sul
do Ceará e, é claro, Pernambuco. A ascendência econômica historicamente
construída, da Capitania do Sul sobre as suas vizinhas, que se expressara
político-administrativamente pela anexação, no século XVIII, fazia com que esse
libertarismo assumisse feições regionais. A crise açucareira posta desde o
século XVII fazia com que essa configuração regional, sem deixar de inserir-se
no movimento mais amplo de contestação ao poder metropolitano, buscasse um
projeto político específico a suas necessidades e peculiaridades. Ou seja: não era a fórmula política de transação
com a Casa de Bragança que expressaria a substância do liberalismo emergente no
“Nordeste” Oriental. Se era um liberalismo à brasileira, como bem o
caracterizou a historiadora Emília Viotti da Costa, escravista e católico, por contraste ao liberalismo burguês e
anticlerical europeu; se era, pois um liberalismo dos proprietários de terra,
no projeto de 1817 já estão postos elementos diferenciadores: o modelo
republicano e a crítica à centralização, fosse
da metrópole, fosse da “metrópole interiorizada”, no Rio de Janeiro,
para usar a expressão da historiadora Maria Odila Silva Dias. O período entre 1817 e 1822 não constituiu, no
entanto, um processo pacífico na Paraíba. A instituição das Juntas governativas
e a deposição das autoridades metropolitanas, até então constituídas, custou
confrontos entre autonomistas e colonialistas, permeando os corpos militares e
espraiando-se pelo interior, alternando-se episódios favoráveis ora a um lado
ora a outro. Mas a memória da repressão de 17 era muito
recente. Paraibanos haviam sido imolados de forma brutal. Famílias bem situadas
na pirâmide social tinham sofrido seqüestro dos seus bens. E a conjuntura fazia
pender a balança para a autonomia seja pelos acontecimentos próximos, em
Pernambuco, com a instalação também da Junta de Goiana e da Junta do Recife,
sejam os mais longínquos, na Corte e em Portugal, com o movimento
constitucionalista no Porto, que ajudava a solapar uma monarquia absolutista já
fissurada neste lado do Atlântico. Há acontecimentos, no processo paraibano, a
merecer rememoração, esquecidos pelo tempo, e o professor Aguiar se referiu a
um deles, como a famosa delegação de poderes, exarada pela Junta Governativa da
Paraíba para que José Bonifácio a representasse junto ao Conselho de
Procuradores das Províncias do Brasil, convocado pelo Regente D. Pedro, face às
ameaças recolonizadoras de Lisboa; mais do que a representação de José
Bonifácio, o documento emanado da reunião conjunta do Senado da Câmara da
capital paraibana e da Junta Governativa, e comunicado em discurso de José
Bonifácio a D. Pedro, em que a Paraíba, em junho de 1822, declara reconhecer no
Regente a única soberania à qual prestar obediência. Também estão a merecer
reflexões e estudos mais acurados fatos como a adesão da área sertaneja,
particularmente constelada em Sousa, adesão essa ao partido da autonomia; e a
participação de tropas paraibanas nas lutas contra as forças metropolitanas do
general Fidié, no Ceará e do general Madeira, na Bahia. Mas complexas são as
paixões políticas dos momentos históricos de rupturas, a produzirem, de um lado
um Manuel Clemente Cavalcanti de Albuquerque, representante eleito da Paraíba
ao Conselho de Procuradores, escolhido por D. Pedro para carregar sua espada,
luvas e bastão na cerimônia de sua coroação como imperador; e, de outro lado,
um Joaquim Manuel Carneiro da Cunha, republicano, que, já indicado à Assembléia
Constituinte de 1823, recusou-se, na mesma cerimônia, ao beija-mão a D. Pedro
I. Nem bem se separa o Brasil de Portugal e a
conjuntura novamente efervescia, com o confronto entre o imperador e a
Constituinte, reveladora das dificuldades em formatar o novo Estado nacional
brasileiro emergente de modo a conciliar a soberania do rei e a soberania
do povo, princípios de organização política conflitantes, inscritos em
nossa autonomia transacionada. Na Paraíba, como em outras províncias, as
desconfianças diante de um quadro político ainda indefinido, pairavam nos
corações e nas mentes. Medo da recolonização, que perduraria longo tempo, até a
morte de D. Pedro I, em 1834, mesmo tendo abdicado do trono brasileiro em 1831. A
Confederação do Equador reitera o espírito libertário regional, mas dá-lhe
novos contornos. A luta contra o autoritarismo, embora o personagem oponente
seja outro, retoma a chama de 1817; o modelo republicano subjaz em 1824, mas o
separatismo confederado é um novo ingrediente, atemorizando os artífices da
monarquia unitarista, para os quais a fragmentação territorial brasileira se
lhes afigurava como perigosa e ameaçadora à manutenção da autonomia
recém-acontecida. A derrota da Confederação do Equador talvez tenha
sido o grande abortamento da virtualidade de um outro país nessa parte do
Brasil. Melhor ou pior? Não sabemos. Derrotaram os Confederados as forças políticas
que, além do medo da divisão do Brasil, tiveram medo da democracia no país.
Pois, consumada a autonomia, a frente ampla antimetropolitana, pré-22, composta
de elementos díspares, se fragmentara diante do grande desafio de construir o
Estado nacional. A nossa Gironda escravocrata temeu a nossa Montanha cabocla,
ou seja, os radicais de Frei Caneca, que, no entanto, como os “montanheses”
franceses, não iam a ponto de incorporarem em seu projeto, o povo mais
desvalido, em nosso caso, os escravos. Na Paraíba, invadida territorialmente por todos os
lados, pelos liberais pernambucanos, norte-rio-grandenses e cearenses, o
governo e o Conselho provincial não extravasam a legalidade e enviam tropas
para auxiliar Francisco de Lima e Silva na repressão aos confederados
pernambucanos. Os liberais da província fazem de Areia um reduto, liberalismo
esse que a derrota parece não ter extirpado, pois que Areia se reedita na
Praieira. A ordem monárquico-centralista, dirigida a Corte,
vai-se instaurando. A construção da ordem: eis o segundo grande
tema da Paraíba imperial. Talvez, o mais desconhecido na historiografia
paraibana relativa ao Império. Reprimido o inimigo fragmentário do momento,
embora ainda não debelado o perigo da fragmentação, o Estado nacional vai implantando
a máquina político-administrativa na província: A Presidência da Província, que
significa a desconcentração do poder e não a sua descentralização e era
exercida em forma de rodízio; o Conselho Provincial, que não terá poderes
legislativos até o Ato Adicional de 1834, quando se converte em Assembléia
Legislativa; o aparato judiciário e policial. Novas vilas e cidades são
criadas, nesse momento, para ampliar a presença do poder público. Através do voto censitário e indireto, instituído
pela Carta outorgada de 1824, eram eleitos os representantes da província na
Assembléia Geral do Império. Apenas cinco deputados, abarcando dois distritos
eleitorais bastante amplos territorialmente: o da capital, incluindo a própria
capital, Alhandra, Mamanguape, Independência (Guarabira), Bananeiras, Areia,
Alagoa Nova, Pilar, Pedras de Fogo e Ingá, com três representantes; e o 2º
Distrito, com dois deputados, incluindo Campina Grande, Cabaceiras, São João do
Cariri, Patos, Pombal, Catolé do Rocha, Piancó e Sousa. Em nível de Império,
uma representação modesta. Mais grave do que isso, porém, era o conteúdo
excludente do sistema eleitoral: apenas 6,4% da população paraibana dele
participavam; e menos ainda, somente 3,9% eram eleitores. Representação
estabelecida territorialmente diferenciada no Estado nacional e socialmente
hierarquizada, evidenciando que o Estado nacional brasileiro constituiu-se de
uma cidadania restrita. Cidadãos ativos,
ou seja, aqueles que podiam votar e ser votados, e era a expressão da época,
eram, usualmente oriundos de elites agrárias estruturadas em grupos familiares,
as parentelas, que controlavam o poder local. Com a criação da Guarda Nacional,
em 1831, o localismo se reforça. Na Paraíba, contudo, esse processo, apesar da
documentação existente no Arquivo Público do Estado, praticamente não foi
analisado. A documentação existente sobre a Guarda Nacional é numerosa. Mas, na década de 30, começam a evidenciar-se
medidas de maior burocratização do Estado, significa dizer, a
institucionalização do poder público, com o preenchimento sistemático dos
cargos de juizes de fora, juizes de paz e juizes de direito. Criam-se corpos
policiais. Multiplica-se o número de cadeias públicas. Instala-se o Tribunal do
Júri. Se tais medidas podem ser interpretadas como tentativas
de debelar a criminalidade, por vezes referida nos Relatórios dos Presidentes
de Província, outras notícias interessantes ainda não foram alvo de maior
investigação, como aquelas referentes a confrontos entre as correntes políticas
da primeira metade do período regencial: os recolonizadores caramurus, os
nacionalistas ou liberais moderados e os chamados radicais federalistas.
Sabe-se que existiu na capital paraibana uma Sociedade Federal da Parahyba do
Norte, que iniciou proselitismo no interior. Sabe-se que, neste início da
Regência, Joaquim Pinto Madeira, na região do Crato, em Jardim, liderava um
levante de intuito restaurador, articulando-se com os “Colunas” do Trono e do Altar, do Recife. Esse movimento
teve ressonância nos sertões do Rio Grande do Norte, Pernambuco e Paraíba:
nesta província, atingiu Sousa, Piancó, Patos, Catolé do Rocha, Cabaceiras,
Bananeiras, Independência, Mamanguape e Ingá. São fatos a demonstrarem que a
ordem não estava estabilizada. Mas, se havia rusgas e pequenos motins,
envolvendo tropas e mesmo povo, como
tão bem caracterizou essa fase José Murilo de Carvalho, a historiografia
paraibana praticamente não fala de movimentos como os que aconteceram no
Recife, tais quais a Setembrizada, Novembrada e Abrilada ou, depois, no sul
pernambucano com os cabanos, ou nem fala também de movimentos como movimentos
regenciais em províncias mais distantes, durante toda a década de trinta. O que
teria acontecido nesta parte do Brasil? A ausência de referências a tais
movimentos é indício da sua não ocorrência? Parece ter sido. Mas, então, o que
aconteceu com essas erupções políticas da época, na província? É uma
interrogação à pesquisa, visto que temos documentação também não compulsada a respeito da Paraíba e existente no
Arquivo Nacional do Rio de Janeiro. Por outro lado, a Regência é um período em que se
instalam várias cadeiras de instrução pública na capital e em outras vilas;
cria-se o Liceu Paraibano, em 1836, instituição que seria, daí em diante, a
primeira formadora das elites dirigentes provinciais; surgem tipografias,
editando os primeiros jornais paraibanos, entre os quais o de Borges da
Fonseca, que chegou a ir ao Tribunal do Júri por crime de opinião. Embora o II Reinado pareça ter transcorrido sem
maiores transtornos, com as famílias políticas se abrigando no bipartidarismo
surgido do Regresso, não era bem assim. Duas questões apontam que a
historiografia paraibana precisa debruçar-se muito mais sobre todo o período
imperial. A primeira questão concerne à Lei de Terras, a segunda, à Revolução
Praieira. Sobre a Lei de Terras e suas decorrências, de um
lado, temos a manifestação de um paraibano, Joaquim Manuel Carneiro da Cunha,
durante o processo de discussão do projeto de lei na Câmara dos Deputados,
dizendo-se representante da região e apontando as dificuldades de regularização
do quadro fundiário, devido à perda de títulos sesmariais ocorridos durante a
luta contra os holandeses; ou devido ao fato de que muitos proprietários ou
grandes posseiros não terem recebido títulos sesmariais; além de outros
embaraços para regularizar a questão fundiária. Por contraste, pesquisa que
vimos realizando a algum tempo, sobre os registros de terras decorrentes da Lei
de 1850 e de seu Regulamento de 1854, não parecem apontar os graves problemas
invocados por Carneiro da Cunha. Têm revelado que a província era território de
fronteira fechada, com poucas terras devolutas; apontam também a presença, em
certas localidades, de um número expressivo de mulheres proprietárias e o
recebimento da terra por herança com uma leve tendência de mercantilização, o
que é uma tendência bastante inversa ao que está ocorrendo na região cafeeira
nesse momento, no hoje Sudeste. Este nos parece ser um tema central para a
compreensão da História nordestina, se somado ao estudo das famílias políticas
através do recurso à genealogia. Sobre a Praieira na província falarei pouco, mas
chega a ser espantoso o silêncio da historiografia. Tivemos o nosso Urbano
Sabino, que é Maximiano Machado; falta-nos o nosso Figueira de Melo, como em
Pernambuco, que seria o depoimento do lado conservador e vitorioso sobre o
acontecimento. Foi o movimento em
Areia algo sem maior relevância ou a vitória dos conservadores apagou a memória
sobre esse acontecimento? Por que a cidade de Areia continuou a ser uma força
de políticos expressivos, ainda depois disso, alguns dos quais descendentes dos
liberais praieiros, como a família Santos Leal? O terceiro tema significativo da Paraíba imperial
é a sua crise agrária, em cujo âmbito se pode compreender a eclosão de
movimentos sociais como o Ronco da Abelha e o Quebra Quilos bem como o processo
de desagregação da ordem escravista e porque, talvez, o abolicionismo não tenha
sido tão forte como em outras províncias. Por volta de 1860, a Paraíba tinha uma população
de 300.000 pessoas, das quais 50% eram elementos livres. Já no final do século
XVIII, a população livre era relevante, como apontam os quadros anexos ao
trabalho da professora Elza Régis sobre a Paraíba do século XVIII. Significa
dizer que a situação crítica da agricultura de exportação, herdada do período
colonial, mesmo quando os escravos persistem em número expressivo no sertão
algodoeiro, como apontou o trabalho de Diana Galliza, estava gestando relações
de trabalho que constituiriam a “solução” das elites agrárias para o problema
da mão-de-obra, quando o fim do tráfico negreiro colocou, junto com ele, a
perspectiva de um fim relativamente próximo da escravidão. A dificuldade de
concorrência nos mercados internacionais, seja do açúcar seja do algodão (salvo
este produto em alguns momentos conjunturais breves, na década de 60), a
conseqüente descapitalização dessas lavouras, a dificuldade para uma
modernização tecnológica, provocaram a segunda sangria de braços que a Paraíba
e a região, de um modo geral, sofreram – lembremo-nos da primeira sangria para
as Minas Gerais. Braços escravos são vendidos, muitas vezes burlando o fisco,
para a região cafeeira florescente nas províncias do Rio de Janeiro, Minas
Gerais e São Paulo. Os homens pobres livres, cuja disponibilidade era grande,
passam a ser encarados como uma saída para a elite agrária, solução mais
barata, dado que a crise agrária não permitia a adoção do sistema imigrantista.
As massas errantes de homens pobres livres começam a ser submetidas à
disciplinarização para o trabalho nas grandes propriedades. Na própria seca de
1877, já é visível esse processo assim como nos discursos dos representantes
políticos da província, embora a participação desta tenha sido modesta no
Congresso Agrícola do Recife, em 1878, quando a questão ficou mais explícita. Para a população pobre livre, acontecimentos que
se inserem no processo mais abrangente de modernização no país, tais como a
abolição do tráfico negreiro, o recenseamento e a obrigatoriedade do registro
civil, decretados pelo Governo saquarema, no início dos anos 50, soavam como o
seu próprio cativeiro. Camponeses do Agreste do Rio Grande do Norte, Paraíba e
Pernambuco fazem eclodir o Ronco da Abelha, que, na opinião de alguns
historiadores como Hamilton Monteiro e Marc Hoffnagel, este trabalhando sobre a
Paraíba, guardaria articulações com os remanescentes praieiros de Areia,
somadas as motivações próprias dos revoltosos, cuja exploração aumentara com a
expansão algodoeira. Pouco mais de duas décadas, novo movimento,
basicamente na mesma área, como reação à nova medida modernizadora adotada pelo
gabinete Rio Branco, a instituição do sistema métrico decimal, agregada ao
aumento de impostos dos governos provinciais do Norte. A “revolta dos matutos”,
como disse Geraldo Joffily, era uma explosão contra a carestia, os abusos dos
governos e do que a massa chamava de “vampiros”, ou seja, os arrematantes de
impostos, coletores e atravessadores. Era revolta nas feiras do Agreste,
irradiando-se por cerca de 30 a 40 localidades paraibanas, igualmente nas duas
províncias vizinhas, atingindo até Alagoas. Várias outras motivações se
imbricam neste movimento, tais como o envolvimento da Igreja, então em
confronto com o Governo imperial na chamada Questão Religiosa; conflitos
políticos locais no âmbito da elite, dívidas fiscais-financeiras e até mesmo
antilusitanismo, forte ainda neste momento. A dura repressão ao movimento, com
os “coletes de couro” do capitão Longuinho, não impediria que, um mês depois,
eclodissem novas manifestações populares, desta vez, contra o recrutamento, em
que a participação de bando mulheres era significativa e precisa ser
pesquisada. Também desta época data a maior visibilidade dos
bandos de cangaceiros, como o de Jesuíno Brilhante. Era uma área em convulsão,
que a seca só fez acirrar, despejando levas de retirantes na capital, onde as
epidemias grassavam, depois de já terem dizimado cerca de 30 mil pessoas na
década de 50. Era num quadro crítico que a Paraíba encerra o seu
período imperial. Asfixiada, ao longo do regime, como as demais províncias,
pela centralização política, empobrecida pela crise agrária e desassistida pelo
Governo. · · · A
fala do presidente Luiz Hugo Guimarães: Como
era de se esperar, a brilhante exposição da professora Rosa Godoy nos oferece
um quadro expressivo da Paraíba durante o Império. Não obstante os limites do
tempo regulamentar estabelecido no Ciclo para os expositores (vinte minutos), a
professora Rosa Godoy pôde cobrir aquele período imperial mostrando suas principais
fases, e mais do que isso, apontando inúmeras ocorrências de vulto ainda pouco
estudadas. O aprofundamento sobre a Revolução Praieira na Paraíba, na
interpretação dos conservadores vencedores; a crise agrária e a Lei de Terras;
a ausência de estudo aprofundado sobre a Paraíba e os movimentos insurrecionais
como a Abrilada, a Setembrizada, a Novembrada, que ocorreram aqui perto, em
Pernambuco; a importância da Guarda Nacional na Paraíba, cuja documentação é
copiosa no nosso Arquivo Público; foram temas levantados pela expositora como
itens importantes a desafiarem a curiosidade, estudo e análise dos nossos
historiadores. Essa
contribuição da professora é bastante valiosa para o futuro da nossa
historiografia, pelo que agradeço em nome dos organizadores deste evento. Dando
continuidade à sessão, teremos a participação, como debatedor, do nosso
consócio Marcus Odilon Ribeiro Coutinho. Historiador, pesquisador, jornalista
atuante, autor de vários trabalhos de cunho histórico, polemista conhecido,
Marcus Odilon ocupará a tribuna para se desincumbir de com brilho, tenho a
certeza, de missão. Com a palavra o historiador Marcus Odilon Ribeiro
Coutinho. · · · Debatedor:
Marcus Odilon Ribeiro Coutinho (Escritor, historiador, membro
do Instituto Histórico e Geográfico Paraibano) Todos estamos
gratificados pela palestra da professora Rosa Godoy. Não foi surpresa, porque
todo o auditório esperava exatamente o que ocorreu. Uma verdadeira aula, no
melhor sentido da palavra. A
minha palavra é apenas para fazer-me intérprete de todos e colaborar e exaltar,
e talvez, no máximo, preencher alguns espaços vazios sobre o que disse a
expositora desse período da história pátria, da qual a Paraíba é uma parte, mas
é totalmente integrada. A
nossa expositora afirma que o período do império foi um período curto e um
período também menos pesquisado. Realmente o período imperial não completou um
século, enquanto que o período colonial
excedeu a três séculos e o período republicano já excede a um século. Mas eu
diria que foi um período muito brilhante, período brilhantíssimo, de fatos
positivos.. Há poucos dias conversando com vários confrades, nós todos
reforçávamos a tese de Gilberto Freire, que dizia que o Brasil é um país que
deu certo. Rigorosamente deu certo. Ora, o
período imperial foi um período de muitos desafios, eu não digo de crises, eu
digo de desafios, e a maioria deles vencidos pelo nosso povo, pela nossa
civilização ibérica. O
primeiro dos desafios era a fragmentação; fragmentação que ocorreu em todas as
Américas, as três Américas, sem nenhum exceção, inclusive na América inglesa,
porque o atual Estados Unidos não eram a única colônia inglesa. O Canadá está
aí, além de algumas outras possessões inglesas no Caribe, inclusive Jamaica. A
América inglesa não conseguiu ter esta unidade. Esta unidade nem sempre fora
conquistada como uma afirmação de cavalheirismo. Reconhecemos que houve
exageros, houve repressões nesse período, como há em qualquer parte do mundo. Até há
pouco tempo eu ouvia um ilustre conferencista dizer que o Brasil não tinha dado
certo, que havia repressão e seria o Brasil um modelo a não se adotar, um povo
infelicitado por muitos períodos de ditadura. Mas, qual o país que não teve
isso? Essas nossas crises foram crises mundiais da espécie humana. A nossa
evolução também, afinal o homem é um só. Em qualquer continente a alma humana
se comporta de igual maneira, evidentemente com algumas variações, até motivada
pelo próprio clima onde ela habita. O
movimento de Quebra Quilos, por exemplo, que se apresentou na Paraíba, foi um
movimento liberal e foi um movimento que reafirma a disposição contestatória do
povo paraibano. Eu discuto isso e na minha opinião é exatamente o contrário. É
rigorosamente em contrário. Estou aqui com um trabalho, uma biografia escrita
por um maranhense sobre o também maranhense Gonçalves Dias, que é um nome
nacional conhecido de todos os presentes, e essa biografia diz que a idéia de
adotar o sistema decimal foi uma sugestão de Antônio Gonçalves Dias, que era um
homem formado em Coimbra, conhecia a Europa, e para lá fora enviado pela
família, com grande sacrifício, pois não havia esse dinheiro fácil. Quando
Gonçalves Dias ia embarcar para Lisboa para fazer o curso em Coimbra, o pai
dele morreu. E foi quase com a contribuição dos amigos que ele foi levado a
prosseguir seus estudos e fazer um curso superior. Ele esteve na Paraíba, o que
realmente pouca gente sabe. Antes de ler esse livro eu não sabia, e soube em
conversa com o historiador Deusdedit Leitão, que é desta Casa, pesquisador de
todas as horas. Então, Antônio Gonçalves Dias esteve aqui na Paraíba, com uma
missão do Barão de Capanema; esteve em todo o Nordeste, esteve no Ceará e
sugeriu ao imperador Pedro II a adoção do sistema metodológico decimal, que era
um avanço na época. Porque aqui no Brasil, é preciso que se diga, no interior
brasileiro mais ainda, cada região tinha um sistema: era a vara, era a cuia,
era o prato, era a lata nos mais diferentes locais. Ficava difícil, professora
Rosa Godoy, ficava extremamente difícil uma fiscalização por parte do governo
imperial, por parte do governo da província e se não fosse por parte do governo
imperial, também por parte do governo republicano. Afinal todos os sistemas
políticos visam uma só coisa: melhorar a qualidade de vida daqueles por que
eles se responsabilizam. Então me parece que a revolução de Quebra Quilos foi
uma revolução muito clerical, fanática, contra a maçonaria. Quando os
revolucionários de Quebra Quilos estiveram em Areia danificaram o teatro (e
veja, Areia, na época já tinha um teatro) porque parecia uma loja maçônica. Se
houve reacionarismo, diga-se de passagem, o reacionarismo estava na parte dos
que promoviam o movimento do Quebra Quilos, que foi também um momento
antimaçônico, porque a maçonaria era muito mal vista pelo clero católico, pois
há pouco tempo tinha havido o grande conflito da questão religiosa, e dois dos
bispos, D. Vital, paraibano e bispo de Olinda e Recife e D. Antônio Macedo, um
baiano bispo de Belém, tinham sido reprimidos. É preciso que se diga, a Igreja
era aliada do Estado, pela Constituição. Os padres, os funcionários, os
sacristãos eram pagos pelo governo imperial. Então a Igreja tinha também que
prestar alguma solidariedade e obediência ao Império. Estavam num acordo que
veio até a República. A República foi quem realmente separou a Igreja do
Estado. Infelizmente esses dois bispos se insubordinaram porque queriam excluir
das lojas maçônicas padres que, por sua livre e espontânea vontade, pertenciam
a esse movimento. Eu não sou maçom, mas reconheço o grande trabalho que foi
feito pela maçonaria em prol da independência, da abolição da escravatura e
depois em prol da proclamação da República, embora a maçonaria tenha perdido
muito a sua força, neste século. A
expositora falou sobre a nossa atuação política, dizendo que a Paraíba tinha
apenas cinco deputados, situação que talvez fosse correta em face da nossa
população. Cinco deputados naquela época representavam muito mais do que 15 de
hoje, quando a população dobrou ou triplicou. Uma
coisa que a professora Rosa Godoy falou era que havia dois distritos
eleitorais, o da capital e o do sertão. Ótimo. No Império, naquele período, se
adotava o voto distrital. Isso é um avanço. Essa idéia do voto proporcional,
que veio com a República, é um verdadeiro horror. Hoje os formadores de opinião
pública são todos unânimes. Boris Casoy se esgoela e chega até à radicalização
de dizer, que uma das coisas que se precisa na reforma política brasileira é
exatamente nós evoluirmos para o voto distrital, que já havia no Império. Acho
que só nos temos de nos orgulhar da época do Império. Naquela
época a população era pequena e as mulheres não votavam. A mulher só veio votar
em 1928, no Rio Grande do Norte, porque a legislação eleitoral era estadual.
Foi a cidade de Lages a ter a primeira prefeita, Dona Adalgisa, e em 1930 houve
duas santa-ritenses; Dona Iracema Feijó requereu um mandado de segurança para
ter o direito de votar., conforme está no trabalho da confreira Martha Falcão.
Mas, salvo engano, no Império os analfabetos já votavam. Os analfabetos tinham
direito a votar, coisa que recentemente foi restabelecido. Agora, precisava ter
uma renda mínima. Era a chamada a lei da mandioca, isto é, quem tivesse uma
renda equivalente a cinco alqueires, ou coisa que o valha, de mandioca, poderia
votar. É
preciso lembrar que foi o Império que, na Paraíba, construiu a primeira escola
de nível médio, que foi o Liceu. Antes disso existia o Seminário dos Jesuítas,
mas tinha sido suprimido pelo Marquês de Pombal. O Marquês de Pombal para a
Paraíba foi um horror, porque não só proibiu uma escola superior, como o
Seminário, como anexou a Paraíba a Pernambuco. E só depois que o Marquês de
Pombal caiu, foi expulso do Palácio Imperial pela princesa herdeira do trono,
D. Maria I, é que a Paraíba teve restituída sua autonomia. Infelizmente a
Historia do Brasil vê muito mal a Rainha D. Maria I; não se pode nem colocar
uma rua com um nome de Maria I, porque a primeira lembrança que se tem dela é
que ela condenou a forca o herói maior, o nosso Tiradentes. Assim ficamos como
que proibidos de homenagear D. Maria I, que, por sinal, morreu no Brasil. Quanto
ainda ao movimento de Quebra Quilos, a sua repressão foi uma coisa horrorosa.
Houve o “colete de couro” e é preciso se lembrar que quem comandou as forças
federais que vieram do Rio de Janeiro contra o Quebra Quilos foi o irmão de
Deodoro da Fonseca. Era uma família horrorosa. E dizem que ele gargalhava, ria.
José Severiano da Fonseca era coronel, chegou a general e depois foi a Barão:
Barão de Alagoas. Uma
coisa que eu quero ressaltar é atuação do maior pintor da Paraíba, que foi
Pedro Américo, que despontou exatamente nesse período. Parece-me que como
artista plástico ninguém superou Pedro Américo; pelo menos é a opinião de todos
os paraibanos. Penso
que já excedi o tempo que me cabia neste debate, agradecendo a atenção de
todos. · · · A
fala do presidente Luiz Hugo Guimarães: Tivemos
a satisfação de ouvir as palavras do nosso debatedor, historiador Marcus
Odilon, que, como sempre, se empolga com entusiasmo ao defender seus pontos de
vista. Ele pede desculpas por ter excedido seu tempo, mas a presidência às
vezes tem que ser tolerante nesse particular, sobretudo quando a exposição do
palestrante está agradando ao plenário. Foi o que aconteceu com o confrade
Marcus Odilon. Coube a Marcus Odilon acrescentar à palestra da
professora Rosa Godoy alguns episódios do nosso período imperial, não
aprofundados pela expositora. Na realidade, a função da professora Rosa Godoy
era fazer uma exposição generalizada, ordenada, cabendo ao debatedor espicaçar,
criar as condições para o debate com o público assistente. Foi o que Marcus
Odilon fez, abordando aspectos do nosso Império com alguns pontos de vista
pessoal. Como ressaltou a professora Rosa Godoy, alguns
aspectos do tema estão consignados no programa do Ciclo de Debates para uma
apreciação mais profunda. Nem por isso, nosso debatedor, com muita
propriedade, deixou de expor e comentar alguns fatos ocorridos naquele período
imperial. Dando continuidade à sessão, concederei a palavra
aos participantes do Ciclo de Debates, começando pelo consócio Guilherme
d’Avila Lins, primeiro inscrito para ocupar a tribuna. Com a palavra o historiador Guilherme d’Avila
Lins. · · · 1º participante Guilherme d’Avila Lins (Sócio do IHGP e presidente
do Instituto Paraibano de Genealogia e Heráldica): Gostaria
de parabenizar a expositora, professora Rosa Godoy e o debatedor, nosso
confrade Marcus Odilon Ribeiro Coutinho, pelas abordagens muito lúcidas a
propósito do tema hoje abordado. Gostaria
apenas de lembrar um detalhe, eu sou sob muitos aspectos um detalhista; com
relação a este período e mais
particularmente ao trabalho de Maximiano Lopes Machado, cujo trabalho já foi
mencionado como o ponta-pé inicial de sua vocação histórica, com o quadro da revolta praieira na província da
Parahyba, que constitui nada mais que um relato de um participante,
portando de parte interessada, num trabalho excepcional, cuja primeira edição
só se conhece hoje quatro ou cinco exemplares. Esse
trabalho precisaria de uma releitura com interpretação crítica porque ele
representa uma descrição de um ator da História e como descrição de ator ele
precisa de uma leitura crítica interpretativa e penso que seria uma
contribuição importante para este detalhe. Além deste trabalho Maximiano Lopes
Machado também tem A História da
Província da Paraíba e um outro sobre a Capitania de Itamaracá, além de
outros trabalhos. Ele foi secretário do Instituto Arqueológico Pernambucano e
fez parte da comissão que estudou arqueologicamente o jazigo e a ossada de João
Fernandes Vieira. Aquele trabalho de ator da História precisa de uma leitura
crítica. O trabalho de Ambrósio Hischoffer também precisava de uma leitura
crítica, que Alfredo de Carvalho já fez, muito bem feita, mas (quem sabe?)
precisa hoje de uma nova leitura. São trabalhos apaixonados de quem estava
participando de um lado do movimento e tem, sem dúvida, a influência da própria
paixão e da própria cosmovisão do cenário histórico. Era
apenas isso que queria registrar. 2º participante Professor Eduardo (Professor do Departamento de História da
UFPB): Como
um apaixonado pelo Império, seria impossível para mim não intervir. O que eu
gostaria muito de salientar, e que ficou claro no debate aqui, é que tratar de
Império significa tratar da construção do Estado Nacional Brasileiro, e,
portanto, significa necessariamente a gente pôr a questão central da sociedade
brasileira hoje, que é a cidadania. E aí a gente vai ter que levantar estas
questões que a professora Rosa levantou e o debatedor também tocou, que é essa
articulação entre a política, entre o Estado Nacional, entre a idéia de
nacionalidade e os movimentos sociais, a estrutura agrária e as proposições e
projetos políticos que estiveram em jogo durante o século XIX, no Brasil. E
dentro disso, é claro, os movimentos
liberais de 17, 24, 49, entrando também os movimentos sociais dos excluídos,
como o Ronco da Abelha, como o Quebra Quilos, além de outros. É
importante que a gente saliente que esse é um Império sobretudo elitista,
sempre baseado no voto censitário, cuja idéia é do esclarecimento, onde a elite
sabe para onde vai, o povo tem vergonha do povo que tem, e essa é uma marca que
está na construção deste país; realmente movimentos como o de 24 e 48 quiseram
questionar um pouco isso, mas foram sufocados. A repressão não bateu à toa. Na
verdade isso faz parte de uma tradição violenta e autoritária que a gente tem;
é bom lembrar que esse é o período do cangaço, do uso da polícia privada (aliás
não há nem uma distinção muito clara entre o público e o privado); são os
jagunços, são os cabras dos grandes proprietários que funcionam como justiça e
polícia, na prática. Hoje estamos num país democrático, mas é esse
passado, é essa memória que a gente precisa remontar e que, no caso da Paraíba,
existiram experiências que questionaram; acho que está mais que na hora pensar
o que foi 48; a praieira foi um dos episódios mais importantes da história
desta região e que precisa ser revisto. E claro, os movimentos sociais como o
Ronco da Abelha e está aí, até hoje, a questão agrária, que a gente vive
claramente, o êxodo rural. Nós vivemos um quadro estrutural que tem suas bases
montadas no Império. 3º participante Paula Frassinete (Conselheira do IPHAEP): Sou
bióloga e a minha análise da História do Brasil vai mais como militante do que
como historiadora, porque a gente sabe muito bem como foi o ensino de História.
Tenho 56 anos e estudei História há bastante tempo. Parece-me que na minha
época a gente não tinha esse tipo de professora Rosa Godoy, que faz toda essa
discussão crítica da História. O professor Marcus Odilon coloca que a República
já tem seis séculos, é o período que está se demorando mais e anteriormente
Rosa já coloca as crises do fim do Império. É a questão agrária, é a
desassistência do governo com o povo e eu perguntaria à professora Rosa: nós
estaríamos no fim da República também? Porque nós estamos com essa mesma crise.
Ela está aí repetida e acho que 64 pode até ser comparada com a praieira. Estaríamos
terminando este período, já começando, dando os primeiros passos para o próximo
regime que será o socialismo? 4º
participante Célia Camará Ribeiro (Sócia do IHG de Niterói): Mais
uma vez muito obrigada pela oportunidade, parabenizando o Sr. Presidente do
Instituto Histórico e componentes da Mesa, a professora Rosa Godoy e o
historiador Marcus Odilon. Aqui na Paraíba nós temos muitos pontos importantes
do Império. D. Pedro II era um mecenas, que se interessava pela cultura e
prestigiou não só Pedro Américo e Carlos Gomes, como outras figuras nacionais. 5º
participante Odilon Ribeiro Coutinho (Membro do Conselho Estadual de Cultura e sócio
da Academia Paraibana de Letras): Quero
felicitar a professora Rosa Godoy pela excelente palestra com que nos brindou
esta tarde. Realmente uma palestra de nível universitário, de bom nível
universitário, que é uma coisa que se faz hoje raramente neste país, não apenas
na Paraíba, mas neste país. Eu tenho contacto com outras cidades, cidades
consideradas mais importantes do que a Paraíba, com outras universidades, e
posso dizer isso com absoluta segurança. O que não é nenhuma novidade, pois
todos nós que ouvimos uma vez Rosa Godoy passamos a admirá-la e a admiração
cresce a cada nova palestra que ela faz. Sobre Marcus Odilon, eu sou suspeito para falar, é
uma figura vibrante. Ele põe realmente um fermento em tudo que diz e faz com
que a coisa passe a apresentar um aspecto ardente. O debate, a forma de
comentar o trabalho de Rosa foi realmente uma forma, não apenas cavalheiresca,
e não poderia ser de outra forma em virtude do alto nível da palestra de Rosa;
foi cavalheiresca por que concordou com a exposição de Rosa, apenas
acrescentando alguns detalhes, segundo ele, para preencher pequenas lacunas que
teriam ocorrido. E num tema como esse, tão vasto, essas lacunas seriam
inevitáveis. Mas o que me trouxe aqui a este microfone foi a
forma pela qual o professor Eduardo, da UFPB, se identificou. Ele começou
dizendo que era um apaixonado do Império e isso me animou a vir aqui fazer
alguns comentários. Porque a gente não tem, a gente que se dedica ao estudo da
História, a gente não tem a idéia exata da significação do Império para a nossa
vida e para a formação da nação brasileira. O Império costurou a nossa unidade. Rosa e Marcus
chamaram a atenção para a ameaça de fragmentação que pairou sobre o nosso país
durante o Império. E como isso foi conjurado, como isso foi exorcizado? Rosa
teve a oportunidade de referir-se a isso várias vezes, lembrando José
Bonifácio. José Bonifácio foi o gênio político de maior expressão que as
Américas produziram. E eu estou dizendo isso pensando exatamente nos pais
fundadores da nação americana, grandes figuras de estadistas. Washington era um
homem de bom senso, um intuitivo que soube conduzir a nação com mão segura. Os
intelectuais da revolução americana foram grandes figuras. Um Jefferson, que
figura brilhante! Um Benjamin Franklin, um Madison, um Webster, são figuras
realmente extraordinárias, mas nenhum pelo menos teve oportunidade de revelar a
genialidade política de José Bonifácio. Rapidamente eu queria chamar a atenção
para o fato de que talvez nem todos nós aqui presentes saibamos o que realizou
José Bonifácio. Vou tentar isso rapidamente. José Bonifácio saiu do Brasil com vinte anos e foi
estudar em Coimbra; antes de terminar
os seus estudos já se tinha tornado professor. Aos trinta anos foi comissionado
pelo governo português para estudar onde quisesse com os professores que
escolhesse. Na França, estava lá exatamente por ocasião da Revolução Francesa e
foi discípulo de Lavoisier, que logo depois foi guilhotinado. Na Itália, foi
discípulo de Volta, o primeiro cientista que aplicou, de forma prática, a
eletricidade. Na Alemanha, conviveu com
filósofos e convenceu Humboldt a vir estudar a América do Sul. Na
Suécia, ele que era geólogo (é uma coisa que pouca gente sabe, e dentre os
cento e tantos metais conhecidos ele identificou oito), foi convidado para, com
o status de ministro assumir a coordenação de todas as atividades de mineração
da Suécia, que já tinha uma indústria de aço muito desenvolvida. Volta para
Portugal, assiste à diluição, ao esgarçamento da Revolução Francesa, à ascensão
de Napoleão, à invasão de Portugal pelo General Junot, que fez com que a
família real de Portugal viesse para o Brasil. Nessa ocasião ele assumiu o
comando do Batalhão Acadêmico e enfrentou as tropas francesas que invadiam
Portugal. A família real vem para cá com toda a corte; Portugal ficou sem
quadros para a sua administração e ele ocupou vários quadros da maior
significação no plano administrativo de Portugal. Ele supriu o grande vazio
deixado pela fuga da corte portuguesa. Mas, sempre com o pensamento voltado
para o Brasil. Há uma coisa muito interessante que nunca passa
pela nossa cabeça porque realmente o brasileiro aprende a história de modo
errado. A Independência do Brasil não ocorreu em 22, mas em 1908, quando D.
João VI criou o Reino de Portugal, Brasil e Algarves e aí nós atingimos o mesmo
nível da Metrópole. José Bonifácio está sempre atento ao desenrolar dos
acontecimentos e acompanha o desdobramento das lutas de emancipação da América
Latina, o estraçalhamento da América Latina. A América Espanhola estava
fragmentada em não sei quantas republiquetas. Em 1816, as cortes portuguesas
começaram a reclamar e cobrar a volta de D. João VI. Ele então achou que nessa
ocasião devia voltar ao Brasil, para construir a nossa independência. Chega
aqui com 56 anos. D. João VI foi um rei de grande sensatez, de muito bom senso.
A biografia de Oliveira Lima sobre D. João VI, que acaba de ser reeditada,
segundo Gilberto Freyre, era a melhor biografia que se tinha escrito no Brasil.
Hoje talvez ele pudesse mudar de opinião, se fosse vivo. A biografia que Nabuco
escreveu a propósito do pai, o conselheiro Nabuco de Araújo, é a verdadeira
história do Império. A melhor história do Império é a biografia do conselheiro
Nabuco Araújo. Mas essa biografia revela o homem admirável, perspicaz, sagaz,
que foi D. João VI. Voltou para Portugal, mas deixou Pedro I aqui. José
Bonifácio vem e concebe essa coisa extraordinária. Mas ele concebeu isto porque
ele era um homem do mundo, com uma visão muito larga da história do seu tempo,
da experiência da história de um tempo tumultuado. Ele então teve essa saída
genial. Percebeu que se o país se tornasse independente através do que eu
chamei um dia de heróis eqüestres, aqueles generais a cavalo, espadagão
desafiando o infinito, se o Brasil tivesse realizado a sua independência dessa
maneira, através de um herói eqüestre, dificilmente, e acho que Rosa e Marcus
Odilon concordarão comigo, ele teria evitado ou impedido a fragmentação. José
Bonifácio partiu do princípio, e aí se revela a genialidade do estadista, e
sobretudo a sua falta de preconceito; não era o homem rasteiro, que achava que
amar o Brasil era arranjar um sargentão que fizesse a nossa independência. Ele
verificou que só havia uma maneira de impedir que o país se fragmentasse. Era
colocar à frente do país um homem, cuja autoridade não pudesse ser contestada.
A autoridade do rei não podia, porque era uma autoridade legítima. Ele então
concebeu nossa independência e, mirem que prodígio de concepção genial, a nossa
independência através de um príncipe português representante da Metrópole. E
graças a isso ele conseguiu manter a unidade nacional, que é um milagre. E
tanto isso é verdadeiro que, ao deixar o Brasil, abdicando o trono
brasileiro, voltou para Portugal para
disputar com o irmão D. Miguel o trono português, que D. Miguel tinha usurpado
de sua filha, D. Maria da Glória. Voltou, mas deixou o filho no Brasil, Pedro
II, com apenas cinco anos de idade. E o Brasil entrou numa terrível convulsão,
convulsão que levaria o Brasil certamente à fragmentação se não tivessem sido
conjuradas e exorcizadas a cabanada, a balaiada, revolução aqui, revolução
acolá, revolução farroupilha. Apesar do Regente do Império, Diogo Antônio
Feijó, homem de pulso férreo, nada foi possível fazer para dominar o tumulto
que se alastrara pelo país inteiro. E aí o que é que se faz? Põe-se no trono um
menino que ainda não tinha completado 15 anos – Pedro II. O resultado é que a
tempestade serenou, porque estava no trono uma autoridade legítima. E tão bem
costurada ficou a unidade nacional pelo Império, que a própria República, nos
seus desatinos, não conseguiu destruir o tratado de construção de nossa unidade
realizada pelo Império. O Império é a moldura natural de José Bonifácio. Considerações finais pela professora Rosa
Maria Godoy Silveira: Acho que tudo foi muito bom. Em primeiro lugar, eu começo agradecendo a escuta
atenta do Dr. Marcus Odilon à minha fala, mas confesso, antes de tudo, que faço
parte do time das paixões pela História do Império. Eu sempre gostei, eu acho
que o Dr. Odilon colocou aí muitíssimo bem que no Império estão colocadas as nossas
grandes questões que estão abertas até hoje. Sobre a
questão da formação do nosso Estado Nacional, sobre como ocorreu a organização
do Poder, como foi construída, sobretudo no Segundo Reinado através dos
conservadores saquaremas, a relação com a plebe, não com o povo, o povo segundo
entendemos era a elite hoje, mas com aquilo que eles chamavam de plebe. Acho
que são questões que permanecem abertas na nossa história, principalmente no
momento em que vivemos hoje. A professora Paula, preocupada com o nosso futuro,
pergunta para que lado estamos indo, e eu acho que nós estamos passando por um
momento bastante difícil no país, onde várias dessas questões deveriam ser
revisitadas, inclusive no Império. Eu diria que a principal delas, hoje, é a do
Estado. É complexa a questão do Estado, a relação do Estado Federal com os
Estados membros. A grande questão é que Modelo de Poder organizar. Acho que a
Federação há muito se esgarçou. E nós estamos assistindo aí uma tremenda crise
dessa relação com os Estados membros. Como sou apaixonada pela história do Império, vejo
que ela é a mais contemporânea possível. Tem muito a ver uma coisa com a outra
porque o Império nos elucida as grandes questões do país. Nós temos que
revisitá-la para ver essa costura. Sobre a questão da unidade nacional, colocada aqui
pelo Dr. Marcus e Dr. Odilon, eu acho
que foi uma obra portentosa, uma política portentosa. Não há dúvida. Portentosa
foi também a conquista portuguesa do Brasil e a manutenção desse território,
porque foi uma obra difícil, de grande engenharia política, para usar os termos
da moda. E o Império fez isso. O que eu tentei evidenciar, também, é que nesta
parte do Brasil, que a gente é o Nordeste Oriental, houve a perspectiva ou
experiência de outros projetos políticos. Esses projetos foram vencidos. Tanto
17, quanto 24, quanto 48. Mas, por outro lado, eu acho que seriam projetos
fragmentadores. Disso não tenho dúvida.
O medo era tanto, em particular com o Norte, com as províncias do Norte, como
se dizia, e com o Rio Grande do Sul, por causa da fronteira, mas no meio da
Regência, num debate da Câmara dos Deputados, (a área estava convulsionada com
o movimento cabano no sul de Pernambuco, hoje território alagoano) um deputado
disse que a gente perca o Norte, mas conservemos o resto; aqui era um foco de
convulsão muito grande, pois havia a possibilidade de um outro projeto. Esse é
um lado da história. O outro lado é que houve evidências (é uma história que
acho que também é mal contada, mal pesquisada ainda para nós) que é a história
da recolonização. Nós precisamos estudar mais as tentativas concretas de
recolonização. Tanto a existência dessa sociedade dos colunas em Pernambuco, no
final da década de 20, aliada com Pinto Madeira na região do Crato. Quando
aquela famosa história que o povo diz que é fantasia, outros dizem que não, a
história do retorno de D. Pedro I, que desembarcaria exatamente por essa área,
exatamente em Aracati, para reconquistar o Brasil. Acho que o Primeiro Reinado é outro buraco na
História do Brasil, que a gente precisa estudar muito. Nesse sentido acho que tem evidência da unidade e esse
território teve outros projetos alternativos, embora derrotados. Acho que deve
ser revisitado, mas a gente precisa pensar num novo modelo de construção
política para este país. Estamos sofrendo um processo de reforma do Estado, mas
uma das maiores nebulosidades para nós, porque não está definido ainda o papel
dos Estados membros e dos municípios. A gente sabe que a concentração de
recursos financeiros na mão do Estado Federal tem causado depauperamento para
os Estados e municípios. Então a questão dessa descentralização hoje precisa
ser repensada, ela precisa ser construída pela sociedade brasileira. O Dr. Marcus Odilon lançou também a questão do
Quebra Quilos, como movimento. O Quebra Quilos, depois da análise que o
professor Hermano Souto Maior fez com sua livre docência, onde a Paraíba está
aí incluída, porque ele fez uma análise global do Quebra Quilos em todas as
províncias onde aconteceu, a gente percebe a complexidade de motivações desse
movimento. Eu não diria ser um movimento reacionário progressista, acho que não
é por aí. A gente tem que entender as motivações dos atores da época e aí tem
muita gente envolvida. Há os camponeses, com seus motivos. Hoje há um novo ramo da historiografia, ou um
certo retorno sob nova metodologia, que é a história dos costumes. Acho que
Quebra Quilos dá um belo trabalho sobre o ângulo da história dos costumes, como
apontou o Dr. Marcus Odilon. Quer dizer, o confronto entre costumes
tradicionais de uma determinada sociedade
com suas medidas das feiras, com litro, com a cuia, enfim com as suas
medidas usuais de origem portuguesa e o confronto com outro sistema de medição
que causou muito atrito, inclusive porque os comerciantes também roubavam no
peso. Essa era, no fundo, uma manifestação dessas camadas espoliadas. Alguns
falam que Quebra Quilos foi um movimento social; eu digo, foi; não podemos
esperar dele o grau de conscientização social dos camponeses, que viviam nas
condições em que viviam. Mas foi uma manifestação dessas camadas que sofreram
essas alterações nos seus costumes. Há outras coisas que se somam. Soma-se a
questão da Igreja, como Dr. Marcus Odilon apontou; o envolvimento dos padres
era muito grande nesse movimento, e mostra que a articulação deles ultrapassa o
raio de ação desse território. Somam-se as motivações de proprietários de terra
endividados por causa da crise agrária, com hipotecas, com dívidas de
empréstimos, que aproveitaram o embalo para queimar. Houve uma complexidade de
motivações. A questão da Paraíba na Assembléia Geral. A
Paraíba era mesmo uma pequena província, mas a Paraíba sempre foi muito
enxerida (Não esqueçam que hoje sou
cidadão paraibana, apesar do sotaque). Ela podia ter uma representação pequena,
mas ela era altiva. Nós não fizemos ainda uma reconstituição da participação
dos parlamentares paraibanos lá no Império, sobre os pronunciamentos dos
parlamentares. Quando eu citei a Lei de Terras, Carneiro da Cunha foi um deles
que se manifestou. Lembrei que só teve um paraibano que se manifestou, dos 21
do conjunto que falaram. Alguns deles falaram várias vezes, como Bernardo de
Souza Franco, da província do Pará. Quando disse representação pequena, não
quis dizer inexpressiva. Eu estou até fazendo um estudo mostrando deputado
a deputado, quem falou sobre a Lei de Terras e nós vamos divulgar brevemente
esse trabalho. Acho que a gente precisa recompor esse trabalho da Paraíba na
Assembléia do Império, assim como hoje está sendo feito um trabalho, em
primeira etapa, na Assembléia Legislativa do Estado pela equipe do NDHIR. Isso
vai revelar também uma coisa que é lacunar na História do Império na Paraíba,
que é exatamente o embate na Assembléia Provincial. Quais eram as tendências,
quais eram as correntes, quais eram os grupos familiares. Já tem um trabalho do
Celso Mariz, mas esses debates precisam ser reconstituídos. Sobre Pedro Américo, evidentemente a grande figura
paraibana do Império, eu comecei falando no primeiro parágrafo que ele é, no
gênero biográfico, o que tem seis artigos entre os 118 que levantei sobre o
Império no índice da Revista do Instituto Histórico. É o maior biografado desse
conjunto. Os outros todos têm uma ou duas biografias. Sobre a Praieira, o professor Guilherme falou
sobre a obra de Maximiano mencionando sua posição como ator e eu também acho
que precisamos ver o outro lado. Eu disse que faltou o Figueira de Melo, que
foi o chefe de polícia da praieira, em Recife. A versão que ele contou da
praieira é uma e Urbano Sabino, que era praieiro, conta a outra. Mas esses dois
trabalhos foram publicados pelo Senado e são livros valiosíssimos, na Coleção
Bernardo Pereira de Vasconcelos, no tempo do Petrônio Portela. Falta um trabalho, a exemplo do que foi
feita pela professora Isabel Marçon, hoje na Unicamp, que ela devassou a
praieira em Pernambuco, analisando a imprensa, em seu trabalho de mestrado,
depois confrontando realmente as perspectivas dos vários envolvidos. Eu acho
que a gente precisa um trabalho desse aqui. Porque pouco depois tem a
conciliação. Como é que foi a conciliação aqui na Paraíba, entre os liberais e
os conservadores? Como é que aconteceu? Também é outro tema. Quero agradecer as referências da Dra. Célia e os
acréscimos e queria falar do José Bonifácio, para encerrar. Eu também sou admiradora do José Bonifácio, muito
contraditoriamente da minha parte, primeiro porque eu sou muito fã do
federalismo. Eu acho que a gente construiu uma sociedade democrática, nós
precisamos construir um modelo político que tenha um grau de descentralização e
que tenha instâncias em escalas regionais, estaduais, municipais, cada uma com
suas atribuições políticas, como fizeram os Estados Unidos. Eu concordo com
Tavares Bastos, agora eu admiro esse modelo federalista porque eu vejo na construção
de um federalismo uma possibilidade de um modelo democrático. No entanto, não
foi isso que o Império fez. O Império construiu um modelo unitarista e nisso o
grande artífice foi José Bonifácio. Aí pensando no papel dele, não há dúvida do
grande papel que ele jogou. Foram editadas recentemente pela Companhia das
Letras as obras dele. Dr. Odilon Ribeiro deu um banho de erudição sobre
José Bonifácio, como soe acontecer. Aliás, eu vou contar um segredo, que ele
não sabe. A gente estava fazendo um trabalho para o Centro de Referência
Cultural da Prefeitura e entrevistamos várias pessoas sobre a cidade de João
Pessoa e o Dr. Odilon foi uma delas. Ele contou como eram as praias de Tambaú
na década de 20. Ele falou 75 minutos e coube-me fazer a edição dessa fita. Eu
não fiz a entrevista, mas me coube a edição. Pois bem, a ordem que a gente
tinha era que as edições se reduziam a 15 minutos. Eu fui escutar a fita do Dr.
Odilon, e não obedeci a ordem. Ele precisa ir ver a edição, porque eu, quando
muito, deixei nos 45 minutos. Eu não vou cortar certas belezas, o Sr. contando
os namoros na praia de Tambaú, com lances até picantes. Linda a entrevista;
vale a pena ver na Funjope, em
vídeo. Mas, Dr. Odilon com seu banho de erudição, mostra
o papel de José Bonifácio. José Bonifácio foi o grande estadista da unidade do
Império, com certeza. O maior fascínio
que eu mantenho por ele é porque ele costurou a unidade nacional entre três
províncias bases, São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro. Costurou através da
região cafeeira, que estava emergindo e costurou numa coisa que estava
emergindo naquele momento e foi começando a ser construída mais fortemente a
partir da transferência da capital para o Rio de Janeiro. Foi exatamente o
mercado entre o sul de Minas Gerais e o Rio de Janeiro, que se acentuou quando
a família real chegou. Ali se criou até uma agricultura de subsistência e isso
começou a vincular interesses entre essas províncias. E em torno delas foi que
José Bonifácio arquitetou essa unidade. Eu tenho uma grande questão, e estou
até escrevendo um livro sobre o Império, e já estou no oitavo. São Paulo mesmo
tinha pouca importância. Mas São Paulo contou José Bonifácio. É impressionante
a gente pensar que grupo ao qual se aliava José Bonifácio, aqueles comerciantes
da cidade de Santos, era um grupo que, de repente, vai controlar a política de
São Paulo. O que mais me fascina em
José Bonifácio, contraditoriamente, é que ele foi autoritário, porque ele levou
com mão de ferro esse projeto, percebendo que a centralização era a forma do
Brasil não se dividir, se fragmentar, e provavelmente ser recolonizado. De
outro lado, ele é mais fascinante, porque é ele mesmo que apresenta o projeto
para a libertação dos escravos, já em 1830. Ele tem um projeto de fazer uma
reforma agrária neste país e distribuir terras para os escravos. É uma
fisionomia do José Bonifácio que aparece em menor escala do que a fisionomia e
a consagração dele na História do Brasil, que é o artífice da Independência. Tentei responder às perguntas e agradeço pelos
comentários e questões colocadas pelo Dr. Marcus Odilon e demais participantes. · · · A fala do presidente Luiz Hugo Guimarães: Extrapolamos o horário, mas foi bastante positivo
para os presentes podermos ouvir esse debate esclarecedor sobre o período
imperial, dando-nos uma visão das principais ocorrências na Paraíba assim como
no país. Cumpre-me agradecer a participação de tanta gente
e especialmente da expositora, professora Rosa Maria Godoy Silveira e do
debatedor designado, confrade Marcus Odilon Ribeiro Coutinho. Nós estamos realizando um evento de grande
importância, por isso que estamos filmando e gravando todas as sessões, cujas
fitas vão ser arquivadas na nossa Seção da Imagem e do Som. Com esse acervo,
pretende o Instituto editar os ANAIS desse Ciclo de Debates, como nossa
contribuição às celebrações do V Centenário da Descoberta do Brasil.. O Instituto está aproveitando esta oportunidade
para oferecer aos interessados várias publicações do Instituto e de seus
associados sobre assuntos históricos. Trata-se de uma promoção especial, com
preços módicos e acessíveis. Renovo o convite para a próxima sessão, quando
debatermos o tema A PARAÍBA E A PRIMEIRA REPÚBLICA.A Paraíba durante o Império
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