José Braz do Rêgo:

Um Jovem na Assembléia da Paraíba


Luiz Hugo Guimarães




Roteiro: 1. Origem política. 2. Iniciação parlamentar. 3. Eleições tumultuadas na Assembléia Legislativa. 4. Ação parlamentar no movimento de 1964. 5. Atividade nas Comissões da Assembléia. 6. Conselheiro do Tribunal de Contas do Estado.




José Braz do Rêgo nasceu na cidade de Limoeiro, Estado de Pernambuco, descendente de tradicional família, onde imperava o famoso coronel Chico Heráclio, líder rural (tio de seu pai), que teve grande influência na vida política pernambucana.

Nascido a 07 de janeiro de 1936, José Braz era filho de Ernesto Heráclio do Rêgo e de dª Edite de Lucena do Rêgo, sendo o caçula da família.


Iniciou seu curso primário em 1942 no Grupo Escolar Moraes e Silva, em Limoeiro, tendo concluído a sexta série em 1947, ingressando no ano seguinte no Ginásio de Limoeiro. Aos dezesseis anos foi para o Recife estudar no Colégio Oswaldo Cruz, onde terminou o Curso Clássico, em 1954.

Formou-se em Ciência Jurídicas e Sociais pela Faculdade de Direito da Paraíba, na turma de 1959.


Foi eleito deputado estadual ainda quando era acadêmico de Direito, nas eleições de 03 de outubro de 1958, pelo Partido Social Progressista (PSP), com 3.132 votos, posicionando-se em 2º lugar dentre os sete deputados eleitos por aquele partido. No seu reduto eleitoral – Cabaceiras –, José Braz obteve 2.792 do total de 3.132 sufragados em seu nome.

Teve seu mandato renovado na eleição seguinte, em 07 de outubro de 1962, dessa vez pela legenda do Partido Trabalhista Brasileiro, ficando em 3º lugar entre os seis deputados do PTB.

Sua terceira legislatura ocorreu quando foi eleito em 15 de novembro de 1966, agora pela Aliança Renovadora Nacional (ARENA), com 2.786 votos.

Em 05 de junho de 1965 foi nomeado Advogado de Ofício pelo governador Pedro Gondim.

No dia 08 de janeiro de 1971 foi nomeado pelo governador João Agripino para o cargo de Conselheiro do Tribunal de Contas do Estado, criado durante seu governo.

Era casado com Dª Maria Pompéia Falcão do Rêgo, de cuja união deixou os filhos Silvana, Adriana e Cláudia.

Faleceu no dia 02 de maio de 1989, em conseqüência de um desastre de automóvel.


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A influência do pai de José Braz do Rêgo foi bastante acentuada nas suas atividades políticas, como não poderia deixar de ser.

Em 1928, Ernesto Heráclio do Rêgo deixou a cidade de Limoeiro e veio para a Paraíba para tomar conta da fazenda “Mirador”, de sua propriedade, localizada em “Carnoió”, hoje Boqueirão, próximo a Campina Grande.


Trabalhador, esforçado, empreendedor, austero, honrado, Heráclio do Rêgo logo se impôs como líder naquela região, sendo eleito prefeito do município de Cabaceiras para o período 1947/50. Politicamente era vinculado às tradicionais lideranças da comunidade, sempre atuando ao lado de Veneziano Vital do Rêgo e Argemiro de Figueiredo, seus parentes. Sua filiação partidária, por conta da influência de Argemiro, foi a União Democrática Nacional.

Elegeu-se deputado estadual em 31.10.1950, pela UDN, com 3.318 votos, ocupando o 2º lugar em votação numa bancada de 15 deputados e exerceu seu mandato de 01.02.51 a 31.01.55. Não pleiteou sua recondução à Assembléia Legislativa. Acostumado no burgo, em contato permanente com agricultores, feirantes e gente humilde, teve saudades de sua gente com quem se misturava no dia-a-dia. Os encantos da capital não o seduziram. Por isso, logo a seguir, candidatou-se novamente à Prefeitura de Cabaceiras, conquistando o mandato para o período de 1955 a 1959.

Seu prestígio na região era inabalável, tanto que exerceu o mandato de prefeito de Boqueirão, quando o distrito foi transformado em município, em três ocasiões: de 1963 a 1969; de 1973 a 1977; e, de 1983 a 1988.

Realizador, nunca foi de muita conversa, sendo conhecido como durão.

Certa vez, o jornalista Hélder Moura, citando Hermes Luna, contou a seguinte história, no jornal Correio da Paraíba:

Quando era prefeito de Boqueirão, Ernesto do Rêgo marcou uma audiência com o governador Ernâni Sátyro, no Palácio da Redenção. O prefeito era conhecido por não levar desaforos pra casa. Por isto, até evitava sair de Boqueirão.

Poucas vezes, Ernesto estivera no Palácio da Redenção. Preferia ficar entre os correligionários.

Não gostava muito de ficar atrás de favores políticos. Procurava fazer sua administração na base de recursos próprios. Mas a reivindicação que tinha era necessária e, até certo ponto, urgente, diante da pressão da população. O pleito era a construção da ponte que ligaria seu município a estrada que leva à Cabaceiras.1 O prefeito preparou-se todo para o encontro.

Quando as portas do gabinete de Ernâni Sátyro abriram-se ele sentiu que tinha tudo para ser atendido. De pouca conversa, Ernesto cumprimentou o governador e foi logo fazendo o pedido: Eu queria que o senhor construísse aquela ponte em Boqueirão, governador. Ernâni, que já conhecia a reivindicação, sacudiu-se na cadeira e disse: Mas, esta ponte só serve para meia dúzia de fazendeiros. Em cima da bucha, Ernesto disparou indignado: Meia dúzia não. Pode servir para uns cinco, porque o sexto era eu e não quero mais essa ponte, de jeito nenhum! Levantou-se, deu meia volta e deixou o governador falando sozinho.

Só voltou ao Palácio da Redenção, anos após, durante os funerais do ex-governador Antônio Mariz.


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José Braz do Rêgo estava cursando o quarto ano da Faculdade de Direito da Paraíba quando resolveu candidatar-se a deputado estadual. Sua vocação havia despontado nas lides estudantis e a força política da família na grande região que abrangia Cabaceiras, Boqueirão e adjacências o empurrava para continuar a ação política do seu pai na Assembléia Legislativa. Como Ernesto Heráclio não apreciara bem a situação de deputado estadual, que o tornava distante dos seus correligionários, aproveitou a vocação de José Braz para substituí-lo naquela Casa Legislativa. A satisfação de Heráclio era estar junto à população daquelas localidades, a quem fazia benefícios individuais e coletivos, quando no exercício da prefeitura local, ou fora dela. Não se sentira atraído a voltar à Assembléia Legislativa.

Naquela área tinha uma votação garantida de pouco mais de 3.000 votos, votação esta que, pelo seu prestígio, podia transferir tranqüilamente para qualquer candidato, como o fez em várias ocasiões em favor de vários candidatos a deputado estadual e federal, e para senador.

Por que não aproveitar esse manancial de votos em favor de José Braz?

Foi assim que Braz se elegeu, ainda acadêmico de Direito, para a quarta legislatura da Assembléia Legislativa do Estado após a queda do Estado Novo (1959/1963).

Com 3.132 votos José Braz galgou a posição de 2º lugar entre os correligionários do Partido Social Progressista. A legenda do PSP abrigou elementos ligados ao Partido Trabalhista Brasileiro.

Em 1958, houvera uma cisão na UDN com o rompimento entre os líderes Argemiro de Figueiredo e João Agripino. Por conta de injunções políticas e de parentesco, Ernesto Heráclio ficou com Argemiro de Figueiredo, deixando a UDN. A saída de Argemiro de Figueiredo da UDN levou-o, com seus correligionários, a ingressar no Partido Trabalhista Brasileiro. Ocorre que, naquela agremiação partidária, o tradicional petebista Hermano Sá, que controlava o Diretório, fez restrições à permanência de Argemiro no PTB. Os argemiristas não poderiam ficar fora do embate eleitoral e o caminho foi o PSP, de Adhemar de Barros, numa composição feita em São Paulo, com a participação do jovem deputado José Targino Maranhão. O historiador José Octávio de Arruda Mello, relatando esse fato, formalizou que o PSP foi o biombo usado pelos petebistas que não foram assimilados pelo ortodoxo petebista Hermano Sá.2

Foram eleitos pela legenda do PSP, além de Braz do Rêgo, os deputados Eduardo de Alencar Ferreira de Rio Tinto, José Targino Maranhão, de Araruna (“Beja”, pai de Maranhão, também ficou com Argemiro), Antônio Leite Montenegro, de Piancó, Petrônio Ramos de Figueiredo e Manuel Figueiredo (filho e irmão de Argemiro), de Campina Grande e Severino Ismael de Oliveira, de Caiçara.

O PSP foi uma legenda de conveniência, tanto que ainda nessa legislatura os deputados Eduardo de Alencar Ferreira e Antônio Leite Montenegro se passaram com armas e bagagens para a UDN, e, posteriormente, os outros três deputados foram para a legenda do PTB, na legislatura seguinte.

Nessa legislatura Braz do Rêgo ocupou o cargo de Quarto-Secretário da Assembléia Legislativa.


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Sua primeira prova de fogo foi durante a eleição para a presidência da Assembléia Legislativa, que significava a Vice-Governadoria, uma vez que Pedro Gondim, estava no exercício da Governadoria, em face da renúncia, por motivo de doença, do governador Flávio Ribeiro Coutinho. Pedro Gondim pretendia candidatar-se ao cargo de Governador e teria, assim, que se desincompatibilizar para ser candidato. O seu substituto legal seria, portanto, o Presidente da Assembléia Legislativa.

O deputado José Fernandes de Lima, do Partido Social Democrático, pleiteava o cargo juntamente com José Teotônio da Silva, do Partido Socialista Brasileiro. As pressões partidárias para conquistar o apoio de cada deputado eram intensas. Os jornais chegaram a noticiar, em manchete, a disposição de Braz do Rêgo em não apoiar o PSD, tamanha eram as invectivas de importantes próceres políticos.

Diante dessa possibilidade, Ernesto Heráclio enviou ao seu filho o seguinte bilhete:


José:


Sei de seu constrangimento em votar no deputado José Fernandes, entretanto, exijo que você acompanhe a orientação do nosso amigo e seu líder Manuel Figueiredo.


Abraços do velho pai


a) Ernesto Heráclio do Rêgo

28/5/960.3


José Fernandes de Lima foi eleito presidente da mesa da Assembléia Legislativa, tornando-se o substituto natural do Vice-Governador Pedro Gondim, em exercício no Governo do Estado. José Braz do Rego foi eleito para a Primeira-Secretaria na chapa de José Fernandes.

Com efeito, quando houve o afastamento de Pedro Gondim, José Fernandes de Lima assumiu o Governo do Estado por dez meses (1960/61), levando do PSP o deputado José Maranhão para seu Secretário de Agricultura.


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Na fase de Pedro Gondim como Vice-Governador, em exercício do Governo do Estado, houve um surto de criação de novos municípios, “como forma de carrear recursos para o Estado através do fundo de participação estabelecido pela Constituição Federal de 1946”.

Cabia a José Braz do Rêgo apresentar um projeto para a criação do município de Boqueirão, mas para facilitar sua rápida aprovação, ele solicitou do deputado padre José Augusto da Silva Galvão, eleito por Pocinhos, para apresentar o projeto de Boqueirão. Assim, foi criado o município de Boqueirão, pela Lei nº 2.078, de 30 de abril de 1959.

A febre de emancipação, inspirada por Pedro Gondim quando substituiu o governador Flávio Ribeiro, foi estancada na Governadoria de José Fernandes de Lima; em fins de 1961, porém, ela voltou com toda força, após a eleição de Pedro Gondim, que era um entusiasta da pulverização municipal. Basta dizer, como menciona Deusdedit Leitão na edição por ele aumentada e atualizada do livro Memória da Assembléia Legislativa, de Celso Mariz, que o movimento emancipacionista culminou, numa tacada só, em 22 de dezembro de 1961, com a sanção do Governador criando 22 novos municípios.

Desta vez, José Braz do Rêgo foi o responsável direto pela criação do município de Barra de São Miguel, pela Lei nº 2.623, de 14 de dezembro de 1961, antigo distrito que pertencia à sua área de influência política.

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Nesse quatriênio, a atividade parlamentar dos deputados paraibanos foi intensa. Deusdedit Leitão, na obra acima citada, assinala que


os assuntos que provocaram maiores debates entre os deputados foram as eleições municipais de Campina Grande; a prática desenfreada do jogo do bicho; a criação da codeno, que deu origem à sudene; a inflação e conseqüente interferência do Fundo Monetário Internacional nas finanças nacionais; os atos da administração do Vice-Governador, em exercício, Pedro Moreno Gondim e do Presidente José Fernandes, como Governador; protestos contra a orientação da sudene em relação ao Porto de Cabedelo; renúncia do Presidente Jânio Quadros; atividades das Ligas Camponesas; os assassinatos do líder camponês João Pedro Teixeira e do proprietário rural Rubens Régis; os acontecimentos do Engenho Miriri”.4


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Na legislatura de 1963/67, José Braz do Rego elegeu-se pelo Partido Trabalhista Brasileiro, cuja bancada ficou assim constituída, pela ordem de maior votação: Antônio Leite Montenegro, Inácio José Feitosa, José Braz do Rêgo, José Targino Maranhão, Romeu Gonçalves de Abrantes e Ronaldo José da Cunha Lima.

Quando as atividades da Assembléia Legislativa se iniciaram, a 1º de fevereiro de 1963, o País já estava sob o regime presidencialista, posto que a 06 de janeiro o referendo popular ratificou o mandato presidencial de João Goulart com cerca de nove milhões de eleitores em dez se pronunciando contra a manutenção do parlamentarismo, que fora imposto com a crise político-militar resultante da renúncia de Jânio Quadros à Presidência da República.

A estratégia dos parlamentares mineiros, no Congresso, foi concordar com o plebiscito para depois das eleições gerais. E assim, entre 14 e 15 de setembro de 1962, foi aprovada a emenda do Senador Benedito Valadares a um projeto do Deputado Gustavo Capanema, fixando o plebiscito para 06 de janeiro de 1963.

Na Paraíba o “não” ao parlamentarismo obteve uma votação de 178.630 votos contra apenas 19.342.

Como se viu, o plebiscito foi realizado propositadamente em janeiro de 1963, depois das eleições de outubro de 1962. Desse referendo o Presidente Goulart saiu fortalecido, exatamente porque o sim pelo presidencialismo significava também o apoio “ao programa de reformas de base, que se vinculara à sua restauração”.5

Apesar da campanha pelo plebiscito não contar com cartazes nem ajuda financeira, na região dominada por Heráclio e José Braz do Rêgo, o comparecimento foi normal, com a votação expressiva de sempre.


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Ao tomar posse na legislatura seguinte, agora na legenda do PTB, Braz do Rêgo deparou-se com o problema da eleição da nova Mesa dirigente da Assembléia Legislativa.

Pedro Gondim, que havia sido eleito Governador, resolveu intrometer-se claramente na composição da Mesa. O Governo pretendia eleger Nominando Diniz, não sendo viável essa candidatura, inclinou-se pela de Clóvis Bezerra. O PTB, junto com o PSB e o apoio do PSD, empinou a candidatura de José Targino Maranhão.

Esse episódio promoveu um espetáculo lamentável, para muitos, uma vez que a campanha eleitoral interna se transformou numa agitação pouco recomendável para a instituição.

Finalmente, surgiram dois candidatos: Clóvis Bezerra, pela situação, e José Maranhão, pela oposição. De certo modo, a candidatura do deputado Maranhão era um desafio ao Governo. No primeiro escrutínio, a chapa de Maranhão venceu a encabeçada por Clóvis Bezerra, por vinte votos contra dezenove. José Braz do Rego votou em José Maranhão, fiel ao acordo entre os partidos PTB/PSB/PSD.

Com os pronunciamentos oficiais dos partidos vencedores pareceu que a Assembléia ficaria com duas Mesas Diretoras, tendo o considerado presidente José Maranhão convocado, em 4 de fevereiro, a Assembléia para, “Reunião Extraordinária que funcionará no período entre 5 de fevereiro e 31 de março de 1963, para apreciar a matéria abaixo especificada...”

As manobras de bastidores se intensificaram, por conta de pressões do grupo udenista de Tacima e Cacimba de Dentro, contrários ao deputado Maranhão em sua área de influência política. O próprio Clóvis Bezerra chegou a ensaiar um esquema de acordo para evitar o confronto.

Em 10 de fevereiro de 1963, Clóvis Bezerra encaminha ao seu líder, deputado Vital do Rêgo, a seguinte carta:

Com a presente, desejo-lhe transmitir o meu pensamento sôbre as últimas ocorrências verificadas na nossa Assembléia, no que se relaciona à eleição da Mesa.

Não sou infenso a qualquer solução alta que venha a por têrmo ao impasse criado nas condições já de todos conhecidas.

A fórmula conciliatória da retirada da minha candidatura, conjuntamente com a do snr. José Maranhão, e apoio de todos ao nome do deputado José Braz do Rêgo tem o meu integral assentimento.

Se você estiver disposto a intervir no caso, sem dúvida, prestará mais um relevante serviço à nossa Paraíba.

Pode fazer desta o uso que lhe convier e ficar certo de que continuará a merecer a admiração e a estima do seu amigo.


a) Clovis Bezerra 6


Não houve acordo, e o deputado Inácio Feitosa, então Presidente da Mesa dirigente do pleito, foi procrastinando a realização do segundo escrutínio, ganhando tempo para o Governo conseguir reverter o quadro que era favorável a José Maranhão. A UDN ameaçou retirar o apoio a Pedro Gondim, se não fossem atendidas algumas de suas reivindicações.


Houve muitas reuniões entre líderes da situação e da oposição, o senador Argemiro de Figueiredo chegou a dialogar com o governador Pedro Gondim.

A pedra no sapato era a presença do deputado Assis Lemos na 1ª Secretaria da Mesa, participação que os udenistas não aceitavam por hipótese alguma.

Discutiu-se a questão do quorum; tudo era motivo para procrastinar a eleição, até que o Governo pudesse contar com uma adesão segura para modificar o resultado do primeiro escrutínio. O assunto, durante três semanas, ocupou a atenção de toda a cidade e teve tanta repercussão fora do Estado que veio a João Pessoa um emissário do Ministro da Justiça para observar os acontecimentos.

O jornalista José Soares Madruga, em sua coluna Diário da Política, no jornal Correio da Paraíba, de 02.02.63, comentava esse quadro no Legislativo, “onde nunca se registrou tanta desconfiança como agora, nem a dignidade dos parlamentares foi tão cruamente atingida por suposições e oferendas que tiram a segurança dos cálculos, com o mercadejar que vai transformando-se a conquista de cargos na Assembléia.”


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O empenho para a conquista da Presidência da Assembléia Legislativa, em fevereiro de 1963, já fazia parte do plano que se esboçava contra o Governo do Presidente João Goulart, segundo opinião de alguns observadores políticos.

Como se sabe, foi durante a campanha do plebiscito que vários empresários articularam e “patrocinaram a criação e o funcionamento de entidades como o Instituto de Pesquisas e Estudos Sociais (IPES) e o Instituto Brasileiro de Ação Democrática (IBAD), em estreito contato com a CIA.”

Então era importante colocar-se à frente do Poder Legislativo pessoa de absoluta confiança das forças de direita, com vistas aos desdobramentos da política nacional.

Nesse episódio causou mal estar o bandeamento dos petebistas Inácio Feitosa e Antônio Montenegro para as hostes governistas, merecendo do senador Argemiro de Figueiredo total repúdio, o qual chegou a declarar: “eles terão o castigo que merecem”.

Depois de muitas démarches não se chegou a um acordo. O problema continuaria indefinidamente se não houvesse quorum suficiente para a realização da eleição. Havia necessidade de uma presença mínima de 21 deputados. Depois de muito cochicho o esquema situacionista conseguiu levar para o plenário esses 21 deputados, sendo 19 do seu grupo e mais o deputado Inácio Pedrosa, do PSD, e José Braz do Rêgo, ligado ao grupo de José Maranhão. Foi eleito Presidente da Assembléia Clóvis Bezerra, enquanto os liderados de José Maranhão não compareceram à sessão, permanecendo durante o tempo da votação na sala da biblioteca da Assembléia, a fim de darem quorum. Nunca acreditaram que Inácio Pedrosa fosse dar o quorum para a eleição, nem Braz do Rêgo, sem qualquer explicação aos dirigentes da aliança PTB/PSB/PSD. Inácio Pedrosa publicamente dera a entender que, magoado com o PSD, iria comparecer àquela sessão decisiva, não sendo surpresa sua conduta. Braz do Rêgo surpreendeu a todos, embora ele tenha comparecido apenas para a votação dos cabeças de chapa, segundo afirmou. Tendo se retirado do recinto, Langstein de Almeida por sua conta compareceu à sessão para votar em Antônio Montenegro para o cargo de 1º Secretário da Mesa, visando apenas prejudicar Braz do Rêgo, como de fato prejudicou.


Foram 23 dias de cochichos, artimanhas, cooptações, calúnias, pressões, barganhas, que quase paralisaram as atividades públicas.

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Quando José Braz do Rêgo foi contatado por Vital do Rêgo, seu primo, para ser o tertius, por sugestão do próprio Clóvis Bezerra, candidato situacionista, ele passou a ter uma conduta mais moderada frente ao desenrolar dos acontecimentos, mas sempre atrelado à oposição, pelo menos até a sessão em que ele concorreu para dar quorum à eleição de Clóvis Bezerra. Aliás, na Assembléia Legislativa, o deputado José Braz do Rêgo sempre teve conduta equilibrada, não era dado a arroubos de oratória, tinha comportamento exemplar. Estreitava amizade com todos os parlamentares.

Mas, todo deputado tem sempre um “calo”. Braz do Rêgo tinha dois “calos”: Langstein de Almeida e seu irmão Agassis. Braz mais à direita, os outros esquerdistas radicais. A área de influência de Braz do Rêgo não ensejava movimento camponês que permitisse a ação que Langstein e Agassis Almeida exerciam em outras localidades, estimulando a posse da terra na marra. Afora pequenos incidentes ocorridos próximo a Cabaceiras, nada se registrou de monta.7

Com o deputado Agassis Almeida houve fortes atritos, a ponto de Braz requerer um exame de sanidade mental dele. Agassis, suplente de deputado convocado, estava sempre tirando o sossego de José Braz do Rêgo. Presume-se que com a veemência e o fervor com que Agassis e Langstein apoiavam a facção favorável à chapa de José Maranhão o deputado Braz foi se afastando aos poucos do esquema; sempre acossado por Vital do Rêgo para aderir à chapa situacionista.

Essa fase da Assembléia Legislativa foi bastante agitada em face da luta encetada pela reforma agrária. A morte do proprietário rural Rubens Régis, dono da fazenda “Jacurí”, ocorrida em 13 de fevereiro não teve, na Assembléia, a repercussão que deveria ter, em face do affaire criado com a disputa eleitoral pela Mesa da Assembléia.

Mas, logo mais houve vários pronunciamentos dos deputados ligados aos proprietários rurais, que responsabilizavam o deputado Assis Lemos como o insuflador das invasões de terras.


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E veio 1964, com a eclosão do movimento militar derrubando João Goulart da Presidência da República.

A agitação na Assembléia foi intensa. No dia 1º de abril o presidente Clóvis Bezerra Cavalcanti convocou uma sessão extraordinária, que contou com a presença de 17 deputados: Clóvis Bezerra, Antônio Montenegro, Joacil de Brito Pereira, Aloísio Pereira, Egídio Madruga, Francisco Souto, Inácio Feitosa, João Batista Brandão, José Gayoso, José Fernandes, José Pereira, José Teotônio, Luiz Ribeiro, Nivaldo Brito, Waldir dos Santos Lima, Marcus Odilon e Severino Ismael. Foi aprovada e divulgada a seguinte nota da Assembléia:


A Assembléia Legislativa da Paraíba, conhecedora da grave situação que comove a Nação brasileira e fiel à sua missão de Poder Estadual e Institucional, e encarnando a vontade do povo paraibano, torna pública a sua posição ao lado da legalidade constitucional e o seu propósito de sustentar a defesa das grandes tradições brasileiras tocantes ás liberdades, à religião, à família e à propriedade, embasamentos do nosso regime democrático.”


A Assembléia foi declarada em vigília cívica, mas Braz não comparecera nem a sessão que lançou o manifesto, nem ao primeiro dia da “vigília”. A partir daí engajou-se no novo sistema, participando do pedido e da votação da cassação, “por falta de decoro parlamentar”, dos deputados Assis Lemos e Langstein Almeida e dos suplentes Figueiredo Agra e Agassiz Almeida, tornada efetiva com a Resolução nº 272, de 10 de abril de 1964.


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Logo em seguida começou a caça às bruxas. Ficou a cargo da Comissão de Constituição, Legislação e Justiça, da qual José Braz do Rêgo era o Presidente, examinar sobre a necessidade de reforma do Regimento Interno, tendo em vista o Ato Institucional, e a conveniência de ser encaminhada à Comissão de Inquérito relação de funcionários da Assembléia tidos como comunistas ou envolvidos em atividades subversivas.

Em maio, a Comissão presidida por José Braz do Rêgo deu parecer acatando o pronunciamento da Assistência Jurídica da Assembléia, e opinou “que uma relação geral dos servidores do Legislativo seja encaminhada ao Comandante do 15º R. I., cabendo a esta autoridade indicar à Comissão de Inquérito os nomes suspeitos de atividades comunistas ou subversivas.”

Inteligentemente, a Assembléia transferia para o Exército a identificação dos seus funcionários subversivos a serem investigados pela Comissão de Inquérito. Ninguém queria passar por algoz.


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Ainda nessa legislatura, o deputado José Braz do Rêgo participou da Comissão Especial para a Reforma da Constituição do Estado, visando adaptá-la aos ditames dos Atos Institucionais nºs 1 e 2, que reformou a Constituição Federal de 1946.

A Comissão, designada pelo então presidente da Assembléia, Waldir Lira dos Santos Lima, foi constituída pelos deputados Clóvis Bezerra Cavalcanti, Joacil de Brito Pereira, Mário Silveira e José Braz do Rêgo, responsáveis pelo projeto de ajuste.

Se bem não participasse intensamente dos debates em plenário, o deputado José Braz do Rêgo era bastante atuante nas comissões.

Nesse período, Braz exerceu a presidência da Comissão de Constituição, Legislação e Justiça, de 1963 a 1966, uma época de grandes alterações nessa área.


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Para a legislatura seguinte (1967/1971), o deputado José Braz do Rêgo foi eleito a 15 de novembro de 1966, tomando posse a 01 de fevereiro de 1967.

Com a reformulação dos quadros políticos, em decorrência do Ato Complementar nº 4, de 20 de novembro de 1965, Braz do Rêgo ficou ligado à legenda da Aliança Renovadora Nacional - ARENA 1, obtendo sua tradicional votação em sua área, conquistando o sexto lugar na composição dos 19 deputados eleitos nessa facção; pela ARENA 2 foram eleitos apenas cinco deputados.


Esse foi um período de certa tranqüilidade, posto que a ARENA tinha maioria, levando à Presidência da Mesa da Assembléia o deputado Clóvis Bezerra Cavalcanti durante quatro anos seguidos, de 1967 a 1970.

A fundação do Instituto de Previdência dos Congressistas da Paraíba se deve em muito à atuação do deputado Braz do Rêgo, que chegou a ir a Brasília em missão especial para examinar o funcionamento do Instituto do Congresso. Nas suas formulações, José Braz sugeriu a participação também dos funcionários da Assembléia e dos vereadores de João Pessoa e Campina Grande, manifestando-se contra a participação dos ex-parlamentares.

Braz teve atuação destacada quando presidiu à Comissão de Reforma da Constituição do Estado para a adaptá-la à Constituição da República, em maio de 1970. A proposta levada a plenário foi aprovada pela Comissão, que estava assim constituída: José Braz do Rêgo, Presidente; Antônio Santiago, Relator; Francisco de Assis Camelo; José Fernandes de Lima, que votou com restrições; e Miranda Freire.


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Durante o tempo em que Braz do Rêgo exerceu seu mandato, sempre esteve preocupado em auxiliar o desenvolvimento de Boqueirão e cidades adjacentes. Com seu apoio e prestígio conseguiu levar àquela região a energia de Paulo Afonso e o abastecimento d’água, além de carrear recursos para a construção do Grupo Escolar “Marechal José Pessoa”, cujo nome depois foi mudado para “Professora Eufladísia Rodrigues”, que foi a primeira professora da região. Em Barra de Santana inaugurou o Grupo Escolar Almirante Antônio Heráclio do Rêgo.


Atualmente existe, em Boqueirão, um colégio que tomou o seu nome.

Nessa legislatura, Braz do Rêgo exerceu as seguintes funções:


- Presidente da Comissão de Constituição, Legislação e Justiça, 1966/1967;

- Presidente da Comissão de Finanças, Orçamento e Tomada de Contas, de 1968 a 1971 (três períodos);

- Membro da Comissão Mista de Reforma da Constituição do Estado, 1967;

- Presidente da Comissão Mista de Reforma da Constituição do Estado (adaptação à Constituição Federal), 1970.


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Por iniciativa do governador João Agripino Filho, foi enviada, em 17 de agosto de 1970, mensagem à Assembléia Legislativa do Estado incluindo um Projeto de Lei criando o Tribunal de Contas do Estado da Paraíba.

Aprovado o projeto, o Governador Agripino sancionou a Lei, que tomou o número 3.627, de 31 de agosto de 1970, criando o Tribunal de Contas, cuja instalação ocorreu no dia 1º de março de 1971.

Em 28 de outubro de 1970 a Assembléia Legislativa aprovou a indicação dos sete nomes que iriam compor a nova instituição, sendo eles José Braz do Rêgo, Damásio Barbosa da Franca, Aécio Villar de Aquino, Antônio Carlos Escorel de Almeida, Luiz Nunes Alves, Carmelo Santos Coelho e Otacílio Silva da Silveira, tendo todos sido nomeados pelo governador João Agripino Filho em 8 de janeiro de 1971.

Deixando de exercer as atividades políticas, Braz do Rêgo dedicou-se de corpo e alma ao seu novo mister, que desempenhou com segurança, austeridade e comedimento.

No Tribunal de Contas Braz do Rêgo foi Vice-Presidente no biênio 1985-1986; Presidente no período 1987-1988; Presidente da 2ª Câmara Deliberativa em 1989, quando faleceu a 02 de maio.

Participou dos Congressos de Assembléias Legislativas em Porto Alegre e Recife, e dos Congressos dos Tribunais de Contas do Brasil, realizados em Maceió-AL (1979), Salvador-BA (1985) e Porto Alegre-RS (1987).


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A condição de ser o mais jovem deputado da legislatura de 1958/62 não o impediu de ser um participante ativo das atividades internas da Assembléia. Participou intensamente das disputas eleitorais pela composição da Mesa Diretora, sendo sempre acatado por suas posições independentes.

Sendo um representante de idéias conservadoras, soube se compor com os partidários do trabalhismo e socialismo, com cujos representantes manteve sempre condições de diálogo, chegando até a apoiá-los em algumas reivindicações consideradas justas sob seu ponto de vista.

Homem de fino trato, logo cedo conquistou a simpatia e o acolhimento da sociedade paraibana, onde se firmou com largo círculo de amizades.

As injunções políticas do tumultuado momento porque passou a nacionalidade levaram-no a conservar os princípios herdados de sua origem política, mantendo, sempre que possível, respeito à lealdade partidária, quando pertenceu ao Partido Social Progressista e ao Partido Trabalhista Brasileiro.


Ao ingressar na ARENA (Aliança Renovadora Nacional), partido oriundo da ascensão do movimento de 1964, que criou o bi-partidarismo, sentiu-se mais à vontade, com uma atuação mais intensa e livre de pressões.

Sua passagem pela Assembléia Legislativa do Estado é um exemplo de que os jovens podem muito bem contribuir para as transformações políticas, no exercício do Poder Legislativo.

1A ponte era em Boqueirão mesmo, que ficava isolada quando o açude de Boqueirão sangrava, segundo informe de Ernesto Heráclio ao autor.

2 Caderno Especial de “A União”, de 01.01.1995, p. 5.

3 Arquivo de Dª Maria Pompéia Falcão do Rêgo, viúva do deputado José Braz do Rêgo, gentilmente facultado à pesquisa do autor.

4 Memória da Assembléia Legislativa, de Celso Mariz, edição aumentada e atualizada por Deusdedit Leitão, 1987, p. 134.

5 O Governo João Goulart – As Lutas Sociais no Brasil - 1961-1964, de Moniz Bandeira, Civilização Brasileira, 2ª ed., 1977, p. 88.

6 Do arquivo particular de Dª Maria Pompéia Falcão do Rêgo, viúva do deputado José Braz do Rêgo, a que o autor teve acesso.

7 Informe do Sr. Ernesto Heráclio do Rêgo ao autor.